segunda-feira, 31 de março de 2008

Red Carpet - A Nova Revista de Cinema

Após a revista Premiere ter fechado as portas ao mercado nacional (ou será que foi ao contrário?), deixou de haver qualquer revista, com o mínimo de credibilidade e dedicação completa à arte, que nos desse em primeira mão as novidades/críticas/entrevistas relacionadas com o mundo do cinema - exceptuando as pequenas secções nos jornais e revistas de moda. Embora o número de blogues e sites relacionados com este universo tenha aumentado de sobremaneira a cobrir uma necessidade de procura (mesmo que em Portugal seja uma minoria), pode-se afirmar que o scroll down do browser em busca de notícias é completamente diferente do folhear de uma revista. Será que o futuro das revistas passará exclusivamente pela sua digitalização?

É durante este momento de transição (ainda sem previsões realistas) que surgiu uma revista online, totalmente dedicada ao cinema - uma revista com folhear de páginas digital, já com três meses de idade. A Red Carpet vem, a meu ver, complementar o já essencial blogue de cinema Deuxieme. Duas questões se levantam: 1) será de todo viável a sua sobrevivência a longo prazo? É necessário optar dois pontos de vista, o financeiro e o das "audiências", neste caso, visitas online; 2) Podem os dois principais meios de divulgação coexistir, uma vez que no blogue Deuxieme o trabalho é totalmente voluntário? Vamos esperar para ver. Por agora, é não deixar fugir esta oportunidade.

Endereço blogue Deuxieme
Endereço da Red Carpet
Download da edição de Abril

Pedro Xavier

domingo, 30 de março de 2008

Die Fälscher - Os Falsificadores

A “Operação Bernhard” foi o plano Nazi para falsificar milhões de libras esterlinas e dólares americanos, com o objectivo de inundar as economias dos países aliados enquanto financiavam o esforço da guerra. No maior esquema de falsificação de sempre, tipógrafos judeus e outros habilitados na arte de copiar falsificaram, no campo de concentração de Sachsenhausen, mais de mil milhões de libras, em notas de 5, 10, 20 e 50, muitas das quais, depois de entrarem em circulação, o Banco de Inglaterra nunca mais voltou a encontrar. No entanto, o seu trabalho no campo de Sachsenhausen impunha aos prisioneiros judeus um terrível dilema moral: quanto mais dinheiro produziam, mais tempo viviam e mais financiavam e fortificavam a posição alemã na guerra.

Enquanto põe esta questão ética aos prisioneiros, o realizador e argumentista Stefan Ruzowitzky dá-nos um drama tenso, intenso e, deva-se dizer, agradável. Ou será desagradável?


A chave para o sucesso de “Die Fälscher – Os Falsificadores” está na escolha do seu herói – ou anti-herói – o único vigarista de entre os artesãos, o falsificador profissional Salomon Sorowitsch (Karl Markovics). O filme começa em 1936 com Sorowitsch, um Judeu Russo em Berlim, a celebrar e a colher dividendos da sua vida de vigarista. Quando é apanhado, é enviado para o campo de concentração de Mauthausen, onde sobrevive alguns anos a pintar os retratos de oficiais das SS.


O oficial Sturmbannführer Friedrich Herzog (David Striesow), encarregado da “Operação Bernhard” e também responsável pela detenção de Sorowitsch, consegue transferi-lo para Sachsenhausen. Separados do resto do campo, os artesãos falsificadores têm camas confortáveis, comida suficiente e música, enquanto continuassem a produzir dinheiro. Ainda assim, conseguiam ouvir os gritos dos restantes prisioneiros do outro lado da cerca.


Interpretado com uma subtileza extraordinária, a personagem do actor Austríaco Karl Markovics, é uma figura complexa: um artista autêntico que prefere falsificar a pintar; um homem pragmático cuja vontade de sobreviver ao fazer tudo o que for necessário para se manter vivo contradiz a sua piedade genuína; a sua figura fria é apenas uma carapaça de um homem que conheceu o sofrimento às mãos dos Soviéticos, antes de emigrar para a Alemanha. Igual ao chefe dos falsificadores, é o comandante Herzog, um Nazi que não acredita na doutrina – há um momento do filme que confessa a Sorowitsch ser comunista – e que, tal como outros, foi apanhado na rede da guerra e seguiu o lema se não os podes vencer junta-te a eles. Embora do outro lado da rede e tal como Sorowitsch, tenta fazer tudo ao seu alcance para sobreviver – esta necessidade torna-se o elo de ligação entre os dois homens.


Também subtil é a realização de Ruzowitzky. Assim como os falsificadores estão isolados da crueldade que abala o resto do campo, também o está o espectador. Quando há uma intromissão, não deixa de ser da mais horrível, que dá a volta ao estômago, tal como se viu em “A Lista de Schindler” (Steven Spielberg, 1993).


Vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro este ano, o filme “Os Falsificadores” é uma interessante perspectiva sobre a adversidade moral, física e emocional encontrada nos campos de concentração, vista pelo anti-herói menos comum que se tem encontrado ultimamente.


Ver trailer de Os Falsificadores


8/10


Pedro Xavier


quinta-feira, 27 de março de 2008

Esta semana no cinema...

O texto seguinte foi publicado no blog Deuxieme a 27 de Março de 2008, com o título: «Estreias da Semana».


NÃO ESTOU AÍ

O cinema é, como todas as artes, uma criação de risco. Por “risco” devo sublinhar todo o arrojo necessário que uma obra deve (ou devia) possuir para se elevar ou, no caso contrário, a falta do mesmo arrojo, que a condena a algo mediano ou mesmo medíocre. Estreia hoje, entre nós, um notável objecto cinematográfico, que nasce do desafio de um enorme risco artístico / pessoal / cultural. Não Estou Aí (I’m Not There no seu original) é o novíssimo filme de Todd Haynes, realizador de obras como Velvet Goldmine (fantástica incursão no mundo da perda de inocência, suspensa sobre o boom da cultura “glam-rock” dos anos 70) e Longe do Paraíso (uma revisitação surpreendente ao classicismo americano dos anos 50), e que se centra num dos maiores ícones da música e da América: o incontornável Bob Dylan.

Se o risco criativo da obra se apresenta já pela enorme complexidade da personagem e do seu peso e herança culturais, afirma-se de antemão que esta é a menor das questões. Haynes vai mais longe e dirige seis actores (Marcus Carl Franklin, Christian Bale, o recentemente falecido Heath Ledger, Cate Blanchett, Richard Gere e Ben Whishaw) no papel de Dylan, cada um representativo das múltiplas facetas deste lendário cantor e compositor, sejam elas de domínio público, privado e/ou fantasiado. Num espantoso mise en scène, Haynes desdobra Dylan no retrato único, onde realidade e fantasia se entrecruzam de forma brilhante, e confere-lhe um cunho biográfico alimentado tanto pela vida real de Dylan como pela sua imagem e histórias a si subjacentes, onde o mito popular e a iconografia se misturam com a veracidade de um homem de capacidades e maneiras tão exuberantes quanto extraordinárias.

Bob Dylan, poeta de intervenção que marcou gerações desde o início dos anos 60 até a actualidade, surge-nos através dos seus amigos (Joan Baez – famosa cantora - discretamente interpretada por Julianne Moore), dos seus fãs (equilibrados entre os que o contestam e os que o veneram), das mulheres da sua vida (onde Charlotte Gainsbourg brilha na pela de Claire) e sobretudo, pelo olhar de um país em plena (e constante) transformação: a América do Vietname, pós Geração Beat, adepta dos Blues, Jazz, do Rock e do Folk (onde Dylan se notabilizou primeiramente), onde o descrédito do poder político se aliava a problemas sociais como o racismo, a droga e a guerra.

Com um enorme poder e sensibilidade artística, Haynes leva-nos para uma viagem inesquecível às mais variadas facetas de um homem único, que travou lutas com a sua própria criação intelectual e o seu compromisso pessoal nas relações humanas que estabeleceu, minadas por um desejo de reclusão constante, de receios e de incompreensão. Oscilando entre um preto e branco magistral e uma cor tão resplandecente como a sua música, Haynes desdobra Dylan em seis corpos diferentes, numa realização estupenda possuidora de uma energia inventiva mas bem contida e devidamente medida para cada cena, em oposição ao formato videoclip que a sua anterior incursão musical (o já citado Velvet Goldmine, que este ano comemora já o seu décimo aniversário) adoptara.

Para além da visão de Haynes, a escolha deste improvável (mas grandioso) elenco é uma peça chave neste enorme labirinto humano, onde para além do destaque das prestações soberbas de Christian Bale (que simboliza Dylan no início da carreira e o mundo do folk, e mais tarde o “abraçar” a causa religiosa) e Heath Ledger (o seu lugar no cinema e a questão familiar centrada na sua mulher e filhas), existe uma “personagem” que vive por si só: Cate Blanchett revisita Dylan em ruptura com o folk e a guitarra acústica, ao aderir à sonoridade eléctrica e ao folk rock, enquanto é confrontado pelos seus fãs que se sentem traídos e ainda pela imprensa e as suas histórias. Blanchett reúne nesta interpretação algo de majestoso, de inigualável, de contornos formidáveis, que não se prendem somente com a questão de representar o sexo oposto, mas a juntar a isso se incluir um “acting” tão vivo e real do papel “do momento” em que ele vive, que faz desta sua interpretação, possivelmente, a melhor da sua carreira.

Contra todos os possíveis factores de criação versus realidade, a vida de Dylan está aqui, bem equilibrada entre verdades absolutas e um hipnótico mundo onírico. Importa ainda relembrar que, neste jogo de máscaras, a juntar a estes seis corpos, Haynes termina o filme com uma imagem do sétimo: o próprio Bob Dylan, que na verdade se chama Robert Allen Zimmerman. Pelos vistos, afinal, os disfarces começaram muito antes do filme, que é absolutamente obrigatório.

5 / 5


Outras Estreias:


NEVOEIRO MISTERIOSO

Frank Darabont (À Espera de Um Milagre) mergulha no cinema de terror, com um fabuloso filme impróprio para cardíacos, que conta a história de David Drayton (Thomas Jane) e o seu pequeno filho que se encontram, entre o largo grupo de habitantes da mesma vila (destaque para a brilhante Marcia Gay Harden), fechados na mercearia local cercada por uma neblina estranha, que esconde uma ameaça terrível. Contra todos os esforços, as resistências acabam por ceder – quer a nível “mutante” como humano, e a luta pela sobrevivência torna-se ainda mais difícil. Cruzando influências de filmes série B, com a lição de John Carpenter bem estudada, e fortemente apoiado no romance de Stephen King em que o argumento se baseia, Darabont fornece-nos duas horas de grande cinema, onde a condição humana e os fantasmas da América se debatem com estranhas criaturas mortíferas que tomam de assalto, sem razão aparente, o mais comum dos mortais. Hitchcock ficaria orgulhoso.

4 / 5


NUNCA É TARDE DEMAIS

Edward Cole (Jack Nicholson) é um executivo milionário que se cruza com Carter Chambers (Morgan Freeman), um mecânico de classe baixa, numa improvável slada de hospital. Unidos pelo fatal destino de uma doença terminal, decidem juntos passar o que lhes resta da vida a concretizar tudo aquilo que sempre desejaram mas não conseguiram. Nesta viagem de combate à tristeza, a realidade dos problemas pessoais de cada um cruza-se com própria celebração da vida e da aceitação do que cada pessoa é por si mesma. Num registo muito simpático, Nicholson e Freeman fazem uma dupla inteligente e apelativa, mas apesar da bondade da mensagem, a força do drama não consegue imperar sobre a moral já explorada e evidente com que o filme se alimenta, para além de sobreviver com uma realização mediana, desprovida de registos de interpretação que deixem marca, algo que dois gigantes como Nicholson e Freeman o sabem fazer sem qualquer tipo de esforço. Ainda assim é um objecto bem articulado, que cumpre aquilo que promete, de forma muito eficaz.

3 / 5


ENTREVISTA

O auto-destrutivo jornalista Pierre Peders (Steve Buscemi), experiente em política e situações de guerra, vê-se a braços com uma despromoção no seu serviço, que o leva, contra a sua vontade, a entrevistar a famosa estrela de séries de televisão Katya (Sienna Miller), e sob um aparente desinteresse entre ambos, estabelece-se uma curiosa relação de cumplicidade que se revela demasiadamente pessoal e… fatal. Baseado no filme de 2003 com o mesmo título, realizado por Theo Van Gogh - um jornalista assassinado em 2004 por um fundamentalista furioso com o visão do Islão que o cineasta mostrou num dos seus filmes – Buscemi, amigo e admirador de Van Gogh, revitaliza a obra anterior, com o mesmo argumento, e fornece-nos um verdadeiro tour de force, contado em 90 minutos e tendo como base o apartamento da actriz, onde cinema e teatro se encontram de forma graciosa, seja pela técnica artística ou pelo fantástico uso de máscaras entre os personagens. Um grande filme a ver, onde Sienna Miller revela porque é uma das grandes actrizes da actualidade.

4 / 5

Francisco Toscano Silva

quarta-feira, 26 de março de 2008

No Reservations - Sem Reservas (DVD)

Realizar uma boa comédia romântica é tão difícil como fazer um bom soufflé: tenta-se ao máximo obter mais uma pequena elevação e tudo pode ir abaixo, ficando como uma panqueca. Pegue-se então em Kate (Catherine Zeta-Jones), uma chef de um restaurante em Manhattan extremamente organizada e cronometrada, com enormes dificuldades em se relacionar com alguém; mistura-se, então, uma sobrinha recentemente órfã (Abigail Breslin); cozinhe-se, abaixo do ponto de fervura, meia hora de uma forçada relação adulto/criança e, por fim, é adicionado Nick, um chef insolente e exuberante (Aaron Eckhart) que, para além da paixão por Pavarotti, é completamente o oposto de Kate: divertido, descontraído e tem uma extrema facilidade em lidar com crianças. Pronto, agora é só deixar ferver mais dez minutos de uma relação amor/ódio e ‘vão-ficar-juntos-ou-não?’, para servir, ainda quente, após uma doce reviravolta. O resultado deve ser horrível, mas é surpreendentemente charmoso ao ponto de dar umas estrelinhas Michelin aos dois chefes de cozinha.

6/10


Pedro Xavier


terça-feira, 25 de março de 2008

Lions for Lambs - Jogos de Poder (DVD)

Lions for Lambs” conta histórias entrecruzadas, todas com base nos desenvolvimentos actuais no Iraque e no Afeganistão. Assim que o filme começa, a prestigiada repórter Janine Roth (Meryl Streep) chega ao gabinete do senador Jasper Irving (Tom Cruise), em Washington, para uma entrevista exclusiva. Anos antes, Roth tinha declarado num artigo à Time que Irving seria o futuro, uma nova visão para a renovação do Partido Republicano. Na entrevista, o senador revela a nova estratégia do exército dos Estados Unidos que irá acabar com a guerra ao terrorismo e devolver à América a fé nos seus governantes.


Ao mesmo tempo, do outro lado do país, o professor Stephen Malley (Robert Redford) inicia uma reunião com um dos seus alunos Todd Hyes (Andrew Garfield), em quem vê um potencial enorme mas que, no entanto, se encontra contido devido a alguma ignorância. O professor começa, então, a contar a história de dois ex-alunos seus Ernest Rodriguez (Michael Peña) e Arian Finch (Derek Luke), que se sentiram motivados a se alistarem no exército e apoiar, dessa maneira, a guerra. A história de Rodriguez e de Finch é contada simultaneamente enquanto estes se encontram barricados e encurralados nas montanhas geladas do Afeganistão, devido a um ataque ao helicóptero onde se encontravam.


A vantagem de “Lions for Lambs” é o argumento de Matthew Michael Carnahan, pois são explorados inúmeros pontos de vista em relação à problemática situação vivida no Médio Oriente o que é, simultaneamente, uma desvantagem, como que um freio a uma forte posição política que possa o filme vir a ter. Mesmo assim, consegue ir mais longe, de uma maneira corajosa - e refrescante à vista – ao apontar o dedo aos media por terem lidado com o início e desenrolar da guerra como se fosse um evento desportivo. A mensagem do tipo “drop what you’re doing and get involved!” não é de todo original, mas pode-se aproveitar para serem analisados diversos pontos de vista.


Em relação aos actores… Tom Cruise tem uma prestação notável como um político engenhoso, calculista e charmoso. Nos casos de Meryl Streep e Robert Redford, parece que todo o seu enorme talento fica subaproveitado devido à pouca densidade dramática das suas personagens.


Lions for Lambs é mais um a entrar no conjunto de filmes que surgem das consequências da política contemporânea, que levantam inúmeras questões mas sem devolverem respostas satisfatórias. A atitude de Irving ao dizer “whatever it takes” é certamente um reflexo da política seguida pela administração corrente para lidar com os problemas actuais. E em relação aos de longo-prazo? Ainda estaremos em guerra por daqui a 10 anos? É tempo de medir o potencial das acções e começar a ver o prisma completo.


7/10


Pedro Xavier



segunda-feira, 24 de março de 2008

Ben-Hur (1959)

O fim-de-semana da Páscoa não podia deixar de ser celebrado pelas televisões nacionais através da reposição de filmes de cariz histórico / bíblico. No entanto, tal como se viu, apenas a emissora pública nacional foi a única que seguiu a tradição e nos presenteou não com “A Maior História de Todos os Tempos” mas com, seguramente, o maior épico bíblico do cinema clássico americano. O filme é particionado pelos eventos da vida de Cristo, a começar pelo seu nascimento no estábulo onde os três reis magos fazem as suas oferendas, e a terminar com a crucificação e a cura milagrosa que se segue à Ira de Deus.


O tema central de “Ben-Hur” (1959) é, pois, o perdão. O padre Holandês Henri J. M. Nouwen escreveu “The only people we can really change are ourselves. Forgiving others is first and foremost to healing our hearts”.


O filme do realizador William Wyler é um remake do filme homónimo de 1925, com o subtítulo “The Tale of the Christ”, realizado por Fred Niblo. Este espectacular filme mudo contou com a participação das estrelas de cinema Ramon Navarro, como Ben-Hur, e Francis X Bushman no papel de Messala e ainda outras 125,000 pessoas como figurantes. Adaptado do romance de Lew Wallace, custou cerca de 4 milhões de dólares (na altura era considerável), tornando-se o filme mudo mais caro da história.


Mas voltando à versão de 1959, este remake foi inspirado pelo facto de, três anos antes, Cecil B. DeMille e o grande estúdio Paramount terem posto, em todo o esplendor dos 70mm, o épico bíblico “The Ten Commandments” (1956). A figura heróica de Charlon Heston – um justo Moisés icónico – seria outra vez convocada para interpretar o papel de Príncipe da Judeia, Judah Ben-Hur, depois da personagem ter sido recusada pelos peso pesados Burt Lencaster, Rock Hudson e Paul Newman.


No enredo, Ben-Hur (Charlton Heston) é injustamente escravizado e enviado para as galeras pelo seu amigo de infância Messala (Stephen Boyd), um romano ambicioso recém-chegado a Jerusalém, mas regressa em busca de vingança, exemplificada pela emblemática corrida de quadrigas que imortalizou o filme. Finalmente, encontra redenção e perdão nas esclarecedoras e inspiradoras cenas finais do filme.


Assim como a versão a preto e branco que a precedeu, a versão colorida de 1959 foi a mais dispendiosa da década de 50, que quase levou os estúdios da MGM à falência. A sua preparação demorou mais de 6 anos, os locais de filmagem foram os mais variados (maioritariamente em Itália) e foram necessários milhares de figurantes – só na corrida das quadrigas foram necessários 15,000 participantes.


Ben-Hur” revelou ser um filme inteligente, excitante e dramático, ao contrário de tantos outros filmes bíblicos, repletos de estrelas de Hollywood. A reprodução da figura de Jesus Cristo foi realizada de maneira extremamente subtil e a Sua aparição foi-nos dada exclusivamente como um cameo – nunca se vê a Sua cara, apenas as reacções de outras personagens para com Ele. Emblemática é a cena da chegada de Ben-Hur e outros escravos a Nazaré, depois da travessia do deserto. Um homem bondoso e com compaixão dá ao desidratado príncipe judeu água que revitaliza o seu corpo e dá novo alento à sua alma, desafiando as ordens do soldado romano. A cena é tão bem conseguida e é-nos dada enquanto vemos por cima do ombro de Jesus a expressão perturbada da cara do soldado romano.


Ben-Hur” foi dos filmes mais galardoados de sempre pela Academia de Hollywood, com 12 nomeações, tendo arrecadado 11 estatuetas douradas. Apenas “Titanic” (James Cameron, 1997) e “The Lord of the Rings: The Return of the King” (Peter Jackson, 2003) conseguiram levar para casa o mesmo número de estatuetas (o primeiro obteve 14 nomeações e o segundo 11) apesar de, ao contrário do filme de 1959, nenhum destes ter ganho nas categorias principais de representação. Charlton Heston levou consigo o primeiro Oscar da sua carreira (ainda chegou a ganhar um honorário), embora a sua interpretação tenha sido considerada inferior à dos outros nomeados: Jack Lemmon em “Some Like It Hot” (Billy Wilder, 1959), James Stewart em “Anatomy of a Murder” (Otto Preminger, 1959) ou Laurence Harvey em “Room at the Top” (Jack Clayton, 1959).



Regressando à corrida de quadrigas no circo romano (uma réplica espantosa), seria injusto não ter em conta uma das mais famosas sequências que ficaram imortalizadas na história do cinema. Veja-se, então, a homenagem que George Lucas lhe faz no filme “Star Wars: Episode I – The Phantom Menace” (1999), com a pod race em que cavalos são substituídos por máquinas avançadas, no entanto é mantido o duelo maniqueísta e intemporal Mal versus Bem entre as personagens. O sítio das corridas foi construído nos arredores de Roma, nos estúdios da Cinecittá, e as filmagens decorreram durante mais de três semanas.


Goste-se ou não, “Ben-Hur” é, sem qualquer dúvida, um dos maiores filmes de todos os tempos.


Ver Trailer

10/10

Pedro Xavier

quinta-feira, 20 de março de 2008

Esta semana no cinema...

O texto seguinte foi publicado no blog Deuxieme a 20 de Março de 2008, com o título: «Estreias da Semana».


O AMOR EM TEMPOS DE CÓLERA

Florentino Ariza (Javier Bardem) é um jovem poeta ingénuo que trabalha nos correios, que se apaixona perdidamente por Fermina Daza (Giovanna Mezzogiono), que lhe corresponde. O romance não é bem visto aos olhos do rico e poderoso Lorenzo Daza (John Leguizamo), pai de Fermina, que assim envia a sua filha para junto da prima, longe de tudo e todos durante uns anos. Florentino aguarda, virgem, a chegada do seu amor, mas quando Fermina regressa encara-o com desprezo, recebendo antes o cortejo de Juvenal Urbino (Benjamin Bratt), um médico famoso com quem se irá casar. De coração ferido, Florentino vinga-se na carne de outras mulheres, enquanto espera que Juvenal morra para reconquistar Fermina, que é o amor da sua vida.

Partindo da premissa da aclamada obra do escritor Gabriel García Márquez, o realizador Mike Newell (Donnie Brasco, Harry Potter e o Cálice de Fogo) filma uma belíssima história de amor sob um olhar absolutamente vazio, sem ideias de cinema, preso a um argumento paupérrimo, que faz de um elenco tão prestável um verdadeiro bando de zombies sem alma nem sangue. É uma tragédia ver uma obra literária, tão importante e relevante como esta, ser reduzida a um telefilme com más prestações, grandes cenários meramente figurativos e sem força nem papel na história, captados por uma realização banalíssima, que não desperta qualquer estímulo no mais comum dos espectadores, ao longo das mais longas duas horas e vinte de sempre. A cultura latino-americana é mostrada sobre os mais batidos “clichés” sociológicos, os cheiros e cores das paisagens são uma realidade distante ou quase nula, as cenas de amor e sexo são tão profundas como as da saga Emanuelle, os actores são monólitos de inexpressividade, dirigidos sobre um completo descuido e num tom de farsa terrivelmente penoso de se ver (de salientar ainda que a caracterização das personagens no seu estado idoso é incrivelmente mal conseguida, a qualquer minuto se teme que sobrancelhas ou narizes ou peitos caiam sem piedade para desmascarar o óbvio). Contra todas as expectativas, seja pelo poder da obra de García Márquez ou até pela competência de Newell já verificada em trabalhos anteriores, O Amor em Tempos de Cólera é, desde já, um dos piores filmes que estreou entre nós (a juntar-se às Duas Irmãs Bolena e ao indescrítivel 10,000 AC). E que pena que assim é.

1 / 5


AUGUST RUSH – O SOM DO CORAÇÃO

Evan Taylor / August Rush (Freddie Highmore, que podemos ver actualmente em As Crónicas de Spiderwick) é um menino orfão especial, com um enorme talento para a música. Reduzido ao orfanato e sem amigos, Evan nunca desistiu da ideia de um dia encontrar os seus verdadeiros pais, que não conhece mas imagina nos seus sonhos. Com receio de ser entregue a uma família adoptiva, Evan parte em busca dos seus entes queridos, e depara-se com um mundo que desconhece, que o levará contra um vagabundo oportunista do seu dom (Robin Williams), e o irá fazer enfrentar os seus medos interiores, na luta para encontrar a sua mãe (Keri Russel) e o seu pai (Jonathan Rhys Meyers), curiosamente dois excepcionais músicos que seguiram forçosamente vidas separadas. A música revela-se, por isso, a chave para o seu encontro.

Kristen Sheridan (filha de Jim Sheridan, que escreveu o argumento de Na América) é a realizadora deste interessante filme, recheado de boas intenções, mas que infelizmente se revela fraco, e por vezes lamechas, no passar da sua bonita mensagem. O seu argumento pobre é a principal causa para o desnorte do filme, que contém a acção bem delineada, mas que se apoia em pressupostos e personagens de linhas demasiado maniqueístas (onde Robin Williams surge num registo secundário absolutamente deplorável, quer pela sua interpretação quer pelo conteúdo da personagem, que nos remete para um “cliché” género Oliver Twist) e que deturpam, no seu plot final, uma visão mais humana (com que o filme até arranca de forma interessante) que a acção tomara no seu início, e que se pedia, sobretudo, no fim. Por isso, temos um eterno lugar comum, misto de contos de fadas, de meninos perdidos, mundos muito estilizados, e um inevitável e descarado “happy end”, misturados à deriva de bons costumes e valores familiares nem sempre fiéis à realidade que os circunda. No entanto, tudo isto não invalida o eficaz trabalho de Sheridan no cuidado da narração e evolução das personagens (boa coordenação de flashbacks com acção presente), bem assentes graças também ao bom trabalho de Freddie Highmore, de Keri Russell (mãe que se refaz com pequenos pedaços do filho), e ainda, de Jonathan Rhys Meyers, num registo diferente mas igualmente competente e caloroso.

2 / 5


HORTON E O MUNDO DOS QUEM

Horton é um elefante divertido, dotado de uma enorme imaginação, que habita numa selva muito peculiar. Um dia, Horton ouve, inadvertidamente, um curioso pedido de ajuda, vindo de um grãozinho de pó que flutua pelo ar que é, na verdade, um planeta minúsculo, onde existe uma cidade chamada “Quem Vila”, onde habitam seres microscópicos que ninguém consegue ver. Os "Quem", seus habitantes, pedem a Horton, dotado de uma excelente audição, que os proteja no seu mundo exterior, mas a incompreensão dos outros animais da selva irá causar-lhe um enorme caso de trabalhos.

Baseado nas personagens de Theodor Seuss Geisel (Dr. Seuss), Horton e o Mundo dos Quem é uma deliciosa história, realizada por Jimmy Hayhard e Steve Martino, que se debruça sobre o poder do mais perfeito processo de animação (trazido até nós, neste caso concreto, pelos Estúdios Blue Sky), onde se esconde uma fabulosa e encantadora história de variados contornos sociais da actualidade, bem explorada numa vertente que atinge os públicos mais novos, como também os mais velhos, de igual forma. Num divertido registo, Jim Carrey transporta para Horton os seus mais diversos tiques e manias de representação, e sobretudo, em paralelo com a dimensão física do herói surgem feitos e emergem necessidades de enorme importância humana, ainda que devidamente mascaradas sobre o comum receio pueril e confronto racional, inerentes a todos os seres. Num interessante triângulo de acções, onde Horton colabora com o presidente da Vila dos Quem (o sempre excelente Steve Carell) e enfrenta a Canguru dominadora da selva (Carol Burnett), é-nos fornecida uma luminosa comédia, onde os cenários e os seus efeitos apaixonam os espectadores, bem como os personagens secundários e os seus gags (o grupo de macacos Wickersham munidos de bananas e o abutre Vlad Vladikoff – com a voz de Will Arnette – são claros exemplos), para além ainda do inventivo e mágico argumento, que se apresenta de forma linear e simples, mas bem carregado de uma mensagem nada vulgar, onde o "tamanho" das coisas ganha um papel fundamental. Mais um triunfo do mundo da animação para todos os públicos sem excepção. Na versão portuguesa temos as vozes de João Baião, Vítor Norte, Inês Castel-Branco e Cláudia Cádima.

4 / 5


OS FRAGMENTOS DE TRACEY

Tracey Berkowitz (Ellen Page), é uma adolescente de 15 anos, que se apresenta nua sob uma velha cortina de banho na parte de trás de um autocarro, enquanto procura desesperadamente o seu irmão mais novo, Sonny (Zie Souwand). Numa interminável viagem, Tracey mergulha no seu mundo estilhaçado, onde em pequenos fragmentos se descobre uma família disfuncional, um mundo de fantasias com o seu namorado Billy Zero (Slim Twig) e uma fragilidade humana de enorme escala, onde a verdade e a criação irreal do desejo andam de mãos dadas.

Que Ellen Page é uma actriz absolutamente notável já ninguém tinha dúvidas (é só ver ou rever Hard Candy e/ou Juno, ainda em exibição entre nós), mas ainda assim cada projecto seu comporta uma curiosa questão inicial: que registo esta jovem actriz nos vai presentear? Os Fragmentos de Tracey é, entre várias coisas, uma surpresa; é uma surpresa enquanto objecto cinematográfico, e uma vez mais enquanto representação “solo” de Ellen Page. Sob um formato “fragmentado”, Bruce McDonald (realizador oriundo da TV) conduz-nos num mundo desencantado, onde o ecrã nos surge fragmentado noutros diversos ecrãs, onde a mesma acção ou acções paralelas decorrem, e que nos presenteiam, numa brilhante narrativa não linear, um retrato cruel da viagem de uma jovem, que se vê a braços com a culpa de ter “perdido” o seu irmão pequeno. No seio desta incessante procura encontram-se necessidades de resolução para a sua família disfuncional, para a marginalização da parte dos seus colegas da escola, e para o despertar sexual e onírico que o seu namorado (que encarna os cânones clássicos do “Rock n’ Roll way of life”) lhe provoca; mundos fragmentados que habitam na sua vida desequilibrada. Perante este argumento de tom clássico e de cunho visual arrebatador, esta é uma obra fascinante e de originalidade evidente, que nos mostra novos caminhos do cinema digital e inovadoras vertentes de fazer cinema.

4 / 5

Francisco Toscano Silva

terça-feira, 18 de março de 2008

Shout Out Louds e Todos os Outros (ou como os grupos musicais se tornam conhecidos através da publicidade)

Este título não é o de um filme Português como o ‘O Fato Completo ou à Procura de Alberto’ de Inês de Medeiros. Simplesmente é uma situação que, no mundo musical pop contemporâneo, se está a tornar recorrente como via de promoção mais mediática de novas bandas de garagem ou grupos de música indie que pretendem dar o salto para uma label de maior nome (o que vai em oposição a toda a filosofia da música independente). De facto, a associação de uma imagem cool passada por marcas de roupa ou telemóveis a bandas musicais (que por vezes, só por si, é-lhes associada uma imagem completamente diferente) está-se a tornar um factor mais do que essencial para a divulgação de um nome ou de um estilo, que vai muito mais além do que os sítios da Internet conseguem fazer.


É por esse motivo que inúmeras bandas saíram dos seus círculos geográficos e além fronteiras conseguiram fazer-se ouvir, seguindo uma receita de sucesso por estas terras lusas: um hit que fica no ouvido e um produto virado para a modernidade – essencialmente telemóveis. Vem isto a propósito da recente ascensão do fenómeno ‘Shout Out Louds’, a mais recentemente conhecida banda Sueca. Caso a situação fosse outra, bandas como os ‘Mew’, ‘Jet’ ou ‘Bloc Party’ continuariam fora do conhecimento da maioria das pessoas? A verdade é a de que esta situação pode ser uma faca de dois gumes. A maioria dessas bandas, depois de produzir um único êxito comercial, regressou ao seu habitat fora do foco pouco natural dos holofotes da fama tendo, então, de viver sob uma promessa de um reconhecimento impossível.




Outros vídeos: The Veils – Leaver’s Dance; Mew – Comforting Sounds; Bloc Party – Banquet;


Links para o MySpace de: Shout Out Louds, Jet, Bloc Party, The Dandy Warhols, Mew, Peter, Bjorn & John, The Veils.


Pedro Xavier

segunda-feira, 17 de março de 2008

Rita Redshoes

Se nos perguntarem, …como se chama a rapariga dos sapatos vermelhos? Certamente diremos que se chama Dorothy. Se a ouvirmos a cantar não diremos que é o tema “Over the Rainbow”. Se nos perguntarem, …afinal, quem é ela? Bom, a resposta é tanto mais simples como as evidências podem fazer crer: ela representa a inovação, o avanço e a modernidade. Não se fala mais de cinema, fala-se de música. Mas de música Portuguesa, de sentimentos cá deste pequeno pedaço de terra, da terra de navegadores e poetas. Embora seja a terra de Camões, aqui ouve-se na língua de Shakespeare. Não, não é defeito, é feitio.

Foi numa manhã de nevoeiro que tomei conhecimento do que aqui se fala. Não foi nenhum prenúncio, foram só as notícias da manhã e logo fiquei intrigado sobre quem seria tal personagem retirada de um mundo de fantasia de bruxas, leões, espantalhos e homens de lata. Redshoes é o seu nome artístico e, em 2007, foi considerada uma revelação quando foi convidada a entrar na colectânea musical ‘Novos Talentos Fnac 2007’. Se veio de um sítio fantástico, tem passado despercebida? A trama adensa-se…

Rita Pereira, a antiga vocalista, baixista e baterista dos ‘Atomic Bees’, acompanhou David Fonseca na tournée de lançamento do segundo disco de originais “Our Heart Will Beat as One” como teclista e pianista. Num dueto com o músico, deu a voz numa das mais conhecidas do disco, a canção ‘Hold StillHold Still’. Passados dois anos, David Fonseca lançou ‘Dreams in Colour’, e Rita passou a dar os primeiros passos a solo, fazendo as primeiras partes dos concertos, prescindindo do apelido, adoptando o artístico. Acabou por lançar a sua primeira colectânea de originais ‘Golden Era’, do qual constam os singles ‘Dream on Girl’ [vídeo abaixo] e ‘Hey Tom’. Numa entrevista, a cantora afirmou «Os dois singles que já estão cá fora dão um bocadinho a imagem (...) do que o disco pode ser. Eu acho que há coisas mais do universo do 'Dream On Girl' (...) e há outras que têm a ver com o 'Hey Tom'. São canções pop alternativo, com um lado de banda sonora de filmes». Voltámos aos filmes?

Neste caso, não foi o Homem de Lata quem ajudou Rita a calçar os seus Redshoes, foi David Fonseca. As semelhanças e influências não podem ser mais evidentes, como se o par se complementasse e a sua música se fundisse num único fluxo artístico, apenas diferenciado pela musicalidade da voz de cada um. Agora, segue o seu próprio caminho, sozinha, percorrendo o país de norte a sul. Uma coisa é certa, já se mostra, e ainda bem.

Link para o MySpace e Blog de Rita Redshoes.

Link para o vídeo 'Hold Still', com David Fonseca.



Pedro Xavier


domingo, 16 de março de 2008

Os três mais esperados

Na quinta-feira seguinte à cerimónia dos Oscar, estreou o oscarizadoEste País Não É Para Velhos”, o filme que premiou os irmãos Ethan e Joel Coen pelo que, a meu ver, é a melhor produção da sua carreira cinematográfica conjunta. Quase um mês depois, e após os rescaldo da cerimónia e da eufórica corrida aos cinemas para o visionamento dos premiados advirá, com certeza, um período contrário ao da bonança, isto é, estreias de filmes maus ou medianos, única e exclusivamente para “encher chouriços” na programação das salas.

Mas enquanto nos resignamos com esta situação, só podemos continuar à espera, no que diz respeito a blockbusters, dos três filmes mais esperados para o ano de 2008 por uma razão, o mistério. Uma pergunta se levanta para dois dos filmes que é a seguinte: como nos vão ser presenteados, quase vinte anos depois, personagens tão emblemáticas como Indiana Jones ou o Joker?

Indiana Jones and the Kingdom of the Crystal Skull trailer

Como nos vai Spielberg apresentar, depois da “Última Cruzada”, um Harrison Ford ainda capaz de nos surpreender? Ou como vai Christopher Nolan nos fazer esquecer da personagem pop a quem Jack Nicholson deu vida, em "Batman" (Tim Burton, 1989)? A expectativa em torno deste filme está criada sobre Joker e não, surpreendentemente, à volta do herói. Já se sabe, Heath Leadger deu a Joker uma personalidade e uma caracterização fiéis à B.D. da DC Comics, em vez de se basear na personagem imaginada por Tim Burton.

The Dark Knight trailer

O outro mais aguardado será o sexto volume/capítulo das aventuras de Harry Potter “The Half Blood Prince”. Com o aproximar do fim, espera-se que os filmes acompanhem os livros no grau de maturidade o que, até agora, não tem vindo a acontecer. Talvez se consiga uma maior fidelidade uma vez que corre o rumor de que o último capítulo será separado em duas partes. Para já, contentemo-nos com a confiança que Dumbledore deposita em Harry com a frase do poster do próximo filme "I'm Safe With You Harry".


Vai ser, portanto, um ano com muitas surpresas pela positiva, …esperemos.

Pedro Xavier

sábado, 15 de março de 2008

Shout Out Louds

Hot Swedish band” é como a revista Rolling Stone apelida a banda sueca ‘Shout Out Louds’, e não é para menos. A banda sensação do momento passou a ser conhecida pela música que deu voz à nova campanha da rede de telemóveis Optimus e que é caracterizada pela voz do vocalista Adam Olenius, muito semelhante à do vocalista dos ‘The Cure’ Robert Smith. Por agora podemos contentar-nos com apenas alguns singles da banda, enquanto se espera pelo lançamento de ‘Our It Wills’, o segundo disco de originais, que os trará à Aula Magna a 26 de Março.

Link para o MySpace dos 'Shout Out Louds'.



Pedro Xavier

Dexter

O conceito de “Dexter”, baseado no romance “Darkly Dreaming Dexter”, é um conceito puramente pulp. Da definição de pulp em “Pulp Fiction” (Quentin Tarantino, 1994) “A magazine or book containing lurid subject matter and being characteristically printed on rough, unfinished paper”, vamos esquecer a parte da má impressão em papel de fraca qualidade e centrar-nos na parte horrível e revoltante que a definição nos dá: Dexter é um investigador forense da polícia de Miami durante o dia e um assassino vingativo durante a noite.

É tão estranho, tão idiossincrático e tão deliciosamente cheio de humor negro, que o choque inicial é rapidamente minimizado pela surpresa por detrás deste conceito. Uma vez que a tortura e o assassinato são temáticas em ascensão na cultura pop televisiva, é certo que conseguimos ver-nos, de pontos de vista diferentes, como sendo psichos artísticos. Levanta-se, pois, a problemática matar é errado vs matar assassinos e pedófilos é certo, o que acarreta elevadas questões morais, não para o espectador, mas para os sistemas de gestão das sociedades contemporâneas.

Desde que nos foi presenteado – sim, foi mesmo um belo presente! - Hannibal Lecter a bebericar chianti e a cozinhar partes humanas ao som de música clássica, nunca mais houve uma personagem do mal que fosse minimamente carismática. Temos, pois, estado rodeados por personagens doentias, distantes da realidade, sem qualquer pedaço de humanidade que as caracterizasse e nos ligasse a elas. No entanto, o actor Michael C. Hall conseguiu trazer um tom familiar e mundano à sua impressionante caracterização de Dexter, provocando laços de simpatia entre a ficção e o telespectador.

Pedro Xavier

terça-feira, 11 de março de 2008

O Escafandro e a Borboleta (DVD)

O Escafandro e a Borboleta” é um daqueles filmes que, tendo estreado no final de Outubro do ano passado, passou completamente despercebido à maioria do público, exceptuando aos amantes do cinema francês. Confesso que fui um dos muitos a quem este filme passou ao lado mas, passados alguns meses, como voltou às luzes da ribalta através da cerimónia dos Oscar - ainda por cima numa categoria importante como a de Melhor Realização – não pude deixar de perder um domingo à tarde para me dedicar à sua visualização.

Jean-Dominique Bauby (Mathieu Amalric) era o editor parisiense da revista Elle até ter sofrido um acidente cerebral que o deixou totalmente paralisado, com a excepção de um olho. Para além de ter sido um playboy, também fora um pai excepcional, um marido irresponsável e um grande escritor. Nos primeiros minutos o realizador Julian Schnabel mostra-nos imagens difusas e desfocadas, acompanhadas pelas vozes dos médicos e enfermeiras que ajudam o espectador a colocar-se na posição de Jean-Do (só o ouvimos em voz off), após ter despertado de um coma de três semanas. Jean-Do recebe a terrível notícia de que sofre de um locked in syndrome, provocado pelo acidente cerebral. Comunicando exclusivamente pelo olho sobrevivente, Jean Do consegue “ditar” frases seguidas que revelam a sua experiência no cárcere que se tornou o seu corpo, comparando-o a um corpo fechado num escafandro, impossibilitado de comunicar. As frases que ditou constituem a autobiografia na qual se baseia este filme e que foi publicada dois dias antes do seu coração ter sucumbido às consequências de uma pneumonia.

A partir do momento que ultrapassa a confusão inicial do estado de Bauby, o filme avança alternando entre as cenas que vive no seu estado estático e as lembranças da sua antiga vida, por vezes conjugando-as em fantasias onde participam as belas enfermeiras que o acompanham. Estas são imagens representativas da personalidade de mulherengo que outrora foi. Na maioria das memórias que invoca intervêm antigas amantes ou o pai (uma interpretação comovente de Max Von Sydow), fantasias coloridas – as borboletas – do que Bauby realmente viveu.

Julian Schanel juntou-se ao argumentista Ronald Harwood e numa palete misturou as cores das borboletas, revelando uma realização audaciosa, alternada entre momentos confusos vanguardistas e outros de uma beleza comovente, de maneira a trazer a história de Bauby ao grande ecrã. Surpreendente é a forma como Schnabel filma os momentos mais melodramáticos, em especial os da visita da sua mulher (Emmanuelle Seigner) e dos filhos, um telefonema do pai e outro da mulher pela qual deixou a sua família. Mathieu Amalric tem, talvez, a melhor interpretação que temos visto em filmes do ano passado, representando uma personagem que a todo o custo se tenta agarrar às pequenas coisas que o ainda tornam humano.

O Escafandro e a Borboleta” é um filme que nos faz pensar na efemeridade da vida e um grande momento de cinema, especialmente pelos gritos de Bauby, que não são ouvidos por ninguém, excepto nós.

8/10

Pedro Xavier

sexta-feira, 7 de março de 2008

Dois discos, duas sonoridades

Róisín Murphy
"Overpowered"

Overpowered’ é uma gema em bruto de 11 músicas que parece fazer esquecer o grande hitSing it Back”. Esta é uma afirmação dura e crua. Mas por essa altura ainda era ‘Moloko’ e agora, volvidos treze anos desde o lançamento de ‘Do You Like My Tight Sweater?’ temos Róisín Murphy, a solo, apaixonada pelo rumo pop que tem vindo a traçar. Já não se ouvem as músicas alternativas que caracterizavam os primeiros discos da banda, ‘Butterfly 747, ‘Pure Pleasure Seeker’, ‘Indigo’, ‘Absent Minded Friends, ‘Remain the Same’, e todas as outras que nos levavam a viajar por ambientes ao estilo de David Lynch, numa mistura de sonoridades epilépticas em orgasmos de cultura anti-Mtv e pastilhas com sabor a tutti-frutti.

E quanto mais os ‘Molokocresciam e evoluíam com o passar da década a acompanhar as novas tendências, melhor produziam a sua música, que culminou com ‘Statues, um incompreendido dance disco que fez sair a voz de Róisín dos headphones de alguns para as pistas de dança de todo o mundo com ‘Forever More’. Quanto mais nos deixamos levar pela luxúria dos ritmos do dance-pop, cada vez mais achamos que é o dia de sorte da música pop. São exemplos ‘You Know Me Better’ e ‘Movie Star’, cujas batidas sensuais e efervescentes nos levam à gloriosa penitência de não estarmos sozinhos no fim do mundo.

A balada final ‘Scarlet Ribbons’ finaliza o caminho feliz que Róisín tem vindo a traçar (já está no fim?) e pomo-nos a pensar que, desde o ‘Ray of Light’ de Madonna, não tem havido qualquer outro disco dance-pop tão maduro. Sim, é mesmo bom!

Nota: samples podem ser ouvidas
aqui

5/5

"Juno OST"

Uma compilação arrebatadora, seja banda sonora de um filme ou não, tem de seguir um protocolo estrito: deve ser feita com especial cuidado, música a música, de maneira a revelar algo novo e maravilhoso. ‘Juno’ – a banda sonora – tanto acompanha o filme nas suas peripécias e estados de espírito, nunca se tornando num acréscimo desnecessário ao desenrolar da história, como, individualmente, é um óptimo disco.

Temos uma colecção repleta de música indie que reúne os ‘Sonic Youth’ (‘Superstar’), ‘Belle & Sebastian’ (‘Expectations’ e ‘Piazza, New York Catcher’) e os ‘The Velvet Underground’ (‘I’m Sticking with You’) – que contém rimas como “I’m sticking with you/’Cos I’m made out of glue”.

No entanto, há duas músicas que se destacam: ‘Sea of Love’ (‘Cat Power’) e ‘Anyone Else But You’ (‘The Moldy Peaches’). A primeira surge num momento dramático do filme; a segunda, é o tema que o encerra e é cantado num cover pelas duas personagens principais.

Sem querer individualizar cada uma das músicas, pode-se gostar ou não de ‘Juno’, o filme. No entanto, esta banda sonora é uma compilação de músicas de amigos, para amigos, e é isso que mais importa.

Nota: samples podem ser ouvidas em
aqui

5/5

Pedro Xavier

quinta-feira, 6 de março de 2008

Repulsion (1965)

Caroline (Catherine Deneuve) é uma jovem rapariga loira que trabalha como manicura num salão de beleza de Londres e vive num mundo aparentemente dominado por mulheres. Partilha o apartamento com a irmã Hélène (Yvonne Furneaux) e, para além desta, tem apenas contacto humano com as colegas do salão e as clientes idosas, cujas faces parecem mumificadas pelos cremes de beleza. No entanto, os homens estão por todo o lado: no trabalho (nos relatos das colegas que se queixam do seu interesse em apenas uma coisa) e em casa.

Caroline está deprimida e repugnada com tudo à sua volta. Olha com repulsa para as faces lamacentas das clientes; repele um almoço de fish and chips; quando chega a casa, fica repugnada com Michel (Ian Hendry), o amante casado da irmã. Quando têm relações sexuais, Caroline não consegue dormir, ficando acordada, enojada com os gemidos provenientes do quarto adjacente.

Os homens, para Caroline, são uma ameaça permanente. Impossibilitada de revelar os seus sonhos a quem quer que seja, começa a confundir a realidade com esses sonhos a partir do momento em que Helène e Michel partem para Itália, deixando-a sozinha em casa. Começa então a alucinar e a ter pesadelos que nos mostram a sua solidão e repressão sexual.

Gradualmente, o mundo à volta de Caroline começa a mudar. Reflectida numa chaleira, a sua cara é monstruosamente defeituosa; um coelho esfolado numa travessa parece-se com um feto humano; as rachas e fendas nas paredes começam a abrir-se, saindo delas braços que a agarram, o que a leva a imaginar uma violação. O mundo exterior à sua mente reflecte os horrores que a assombram.

"Repulsion" é o primeiro filme em inglês de Polanski e é uma obra assustadora e perturbante, não só pelas evocações do pânico sexual – um ano antes Hitchcock também apresentou Marnie (1964) – mas também pelo uso do som, num ambiente expressionista a preto e branco, que leva à criação do apartamento onde decorre a acção como sendo a representação de uma consciência perturbada e atormentada. Este é um trabalho austero, assustador e intemporal, com poucos diálogos mas que impõem um medo inteligentemente desconcertante e onde se mostra a quebra psicológica que Deneuve apresenta numa excelente interpretação.

9/10

Pedro Xavier

terça-feira, 4 de março de 2008

A actualidade de Steve McQueen

O texto seguinte foi publicado no blog Deuxieme a 3 de Março de 2008, com o título: «Este não é o Steve McQueen».

A revista Esquire mostra-nos este mês um curioso artigo, que se prende com a moda clássica desportiva do "americano". E, quem melhor para "vestir" a tradição americana do que um dos seus maiores ícones?

Intitulado "This is not Steve McQueen", o artigo contém 10 fotos com um manequim de McQueen vestido com várias peças, em poses e sítios que recordam todo o seu legado no mundo do cinema: montado na mota d' A Grande Evasão, encostado a um Mustang que nos remete para o incontornável Bullitt ou com o constante ar cool de The Thomas Crown Affair num hangar são alguns dos momentos deste ensaio.

É fascinante analisar, pondo o trabalho da campanha de parte, que tudo aquilo que se pretende vender com isto "agora" - a imagem masculina através dos adereços do vestuário - já McQueen usava há 40 anos atrás. Ainda assim, não vou pegar tanto na questão "original" do que Steve vestia (que já em si é um dado curioso e fortemente marcado nas gerações futuras como se vê), mas sim pelo facto constante da necessidade de consolidar tradições e recorrer-se a eternos clássicos para se decifrar novas tendências da moda, das artes, do pensamento e do próprio cinema.

Vale a pena sobre isto relembrar e repensar Steve McQueen, enquanto notável actor de cinema e ainda como figura masculina de destaque, cuja morte há 28 anos nada afectou na sua essência de homem / personagem, uma vez que continua a ser o único e inconfundível Rei do Cool, seja no imaginário da sétima arte (que revemos em DVD e na TV) como também no nosso quotidiano (presente na publicidade da Tag Heuer e da Ford, que são exemplos maiores actualmente).

Tudo isto não é, por isso, novo. Eis um dos momentos altos dos últimos anos na publicidade: um famoso anúncio do Ford Puma, onde o mundo cool de McQueen se demonstra maior que a própria vida, ao recuperar-se a sua imagem digital nas filmagens de Bullitt e se fazer um minuto de pura magia. Porque Steve McQueen houve um só, e foi, indubitavelmente, um dos maiores tesouros que o cinema conheceu no século passado.

Francisco Toscano Silva