sábado, 7 de fevereiro de 2009

Crime e Castigo


Este romance de Fiódor Dostoiévski é soberbo em todos os pormenores, absolutamente divinal nas entrelinhas (e no resto).

Datado de 1866, narra a história de Rodion Romanovitch Raskolnikov, um homem pobre que aspira a grandeza enquanto ser humano. Esta personagem carrega o peso da corrente filosófica e literária existencialista, que considera cada um como um ser único, responsável pelos seus actos e consequente destino.

"A existência precede a essência" na medida em que é através da nossa existência que nos vamos conhecendo e constantemente redefinindo o nosso pensamento. Ou seja, temos em nosso poder uma imensa liberdade, fazemos as nossas escolhas, traçamos o nosso rumo, definimos o que é, para cada um de nós, o sentido de responsabilidade.

A premissa de atingir a salvação através do sofrimento (cerne da obra em questão), corrobora estas linhas de pensamento filosófico.

Raskolnikov propõe-se fazer algo que, em sua opinião, mude a sociedade. Assim, e numa constante luta interior, mata uma velha agiota e a sua irmã.

É consumido, então, pela culpa e sofrimento, aos quais se segue o arrependimento e a confissão (salvação).

A visão do autor sobre a religião está muito presente no romance, especialmente quando a personagem de Sônia (uma mulher que nunca abandona Raskolnikov) compartilha a leitura de passagens do Novo Testamento com o mesmo.

A personagem de Svidrigailov é, possivelmente, uma das mais niilistas Dostoiévski.

Os dramas psicológicos de Raskolnikov prendem o leitor de forma subliminar.

É, sem dúvida, uma obra obrigatória.


Sara Toscano

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

For Your Consideration...

Pois bem,

2008 já começa a ficar perdido na memória (estranhamente não me lembro onde e com quem estive na noite de 31 Dezembro) e começa a ser a altura dos balanços. E o balanço mais excitante de que me lembro é o Top 10 dos filmes de 2008 que vi (sim a minha vida social é assim tão má).

Atenção:
Opinião Subjectiva!

10. Sweeney Todd: The Demon Barber of Fleet Street


Melhor: Desde "The Nightmare Before Christmas" que não ficava tão agradavelmente horrorizado com um Musical. Obrigado Mestre Burton.

Pior:
O péssimo (excelente) actor Alan Rickman. De garganta cortada tarde demais.

9. The Darjeeling Limited


Melhor: Realização, Elenco, Guião, Mensagem, Banda Sonora, Cinematografia, Curta-Metragem, Produção Artística e.... já falei da realização?

Pior:
Estrutura desequilibrada no 2º Acto mas é só mesmo para ser picuinhas.

8. Cloverfield


Melhor: Por ter reinventado um género que se pensava já ter esticado o pernil.

Pior: Devido ao movimento de câmara à mão pode cansar um pouco o espectador mais incauto.

7. Burn After Reading



Melhor: O mais engenhoso e delicioso filme sobre nada.

Pior: Algumas caricaturas dos personagens que forçam um pouco a barra.

6. Forgetting Sarah Marshall


Melhor: Comédia bem escrita com personagens desenvolvidos. A Sério, não estou a brincar!

Pior: Não deixa de ter algum (pouco, muito pouco) humor rude.

5. Blindness


Melhor: A realização de Meirelles. A estética leitosa e Julianne Moore, sempre Julianne Moore

Pior: Não é decididamente para todos. Um filme cru e cruel. Não que seja um defeito, claro.

4. In Bruges



Melhor: A poesia violenta que nos dá um arrepio na espinho e calor no coração.

Pior: Algumas situações inverosímeis que tendem a retirar-nos da narrativa.

3. Quantum of Solace


Melhor: Uma sequela directa que não perde em força muito graças ao meu anti-herói favorito James Bond (os olhos azuis gélidos de Daniel Craig fazem-lhe metade do trabalho).

Pior:
O argumento por vezes torna-se instável e um pouco flatulento mas lá se endireita.

2. Dark Knight

Melhor: Por mostrar que um filme baseado em B.D. pode ter um clássico storytelling, construindo uma alegoria social sem perder o sentido de espectáculo. E o Joker rouba esse espectáculo .

Pior: Haver alturas em que julgava que da voz do Batman iria sair a frase: "Luke, I´m you father!"

1. Wall-E

Melhor: O filme mais humano deste ano é protagonizado por um robô. E a Pixar sabe pura e simplesmente contar uma história como mais ninguém da indústria.

Pior: Não há (não me vou por aqui a inventar!).


Nuno Soler

Desejos e afins...

Bom 2009!

Para todos os preocupados,
para os que querem responder,
para os que não conseguem perguntar,
para aqueles com medo do que pode acontecer.
A todos um visceral e acutilante 2009!!!
Que respondam antes da pergunta,
que aconteçam antes de ver,
que se preocupem em ser...

Bom Ano!!!

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Os Gigantes da Montanha


A peça inacabada de Luigi Pirandello está em cena no Teatro da Cornucópia até dia 21 deste mês. É uma preciosidade que fascina e surpreende.

O teatro sobre o teatro é recorrente na obra de Pirandello (já em A Fábula do Filho Trocado), mas sempre com um toque mágico de ilusão e sonho. A simplicidade do cenário deixa um grande espaço à imaginação. As personagens são fortíssimas e extremamente bem representadas, com destaque para a interpretação de Rita Loureiro e de Luis Miguel Cintra.

O terceiro Acto da peça nunca foi escrito. A encenadora Christine Laurent optou por terminar a peça no segundo Acto, com a aproximação dos Gigantes da Montanha, com a terra a estremecer. É, sem dúvida, um final com muita força.

É preciso não deixar esquecido o trabalho maravilhoso de Daniel Worm D'Assumpção, responsável pelo desenho de luz da peça.

A personagem de Cotrone (Luis Miguel Cintra) pode ser vista como uma personificação do próprio Pirandello - o encenador de um teatro do inconsciente.

A peça é uma bela confrontação entre o que é e o que parece ser.

Imperdível!


Sara Toscano

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

West Side Story


Está presentemente em cena, no Teatro Politeama, o musical West Side Story de Filipe La Féria, baseado na concepção de Jerome Robbins, guião de Arthur Laurents e música de Leonard Bernstein.

O Teatro Politeama, já uma referência no mundo do teatro, teve em cena alguns sucessos, entre eles Amália, My Fair Lady, Música no Coração e Jesus Cristo Superstar.

West Side Story constitui uma modernização do conflito trágico de Romeu e Julieta, de William Shakespeare. Transposta de Verona para o Upper West Side de Manhattan, a peça centra-se na eterna luta de gangues, neste caso entre porto-riquenhos e "americanos", com um clímax trágico poderoso.

Em 1961, o enorme sucesso da adaptação da peça ao cinema (que conquistou 10 óscares), tornou West Side Story mundialmente conhecido.

La Féria contou com alguns grandes nomes do palco português; de salientar a prestação (sempre) preciosa de Anabela e de David Ventura.

A voz de Bárbara Barradas é extremamente poderosa e arrepiante e Rui Andrade oferece-nos uma belíssima versão de "Maria", capaz de comover qualquer um.

Precisamos, ainda assim, de muito mais iniciativas desta natureza!


Sara Toscano

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

London

Quando vi o conjunto de posts sobre Londres no blog da Wasted Blues, fiquei roído de inveja. Amanhã, concretiza-se um sonho. Roubo desavergonhadamente a imagem que me fascinou em London Calling IV e que me fez recordar o quão maravilhoso é o filme da Disney Peter Pan. Até breve.


Pedro Xavier

terça-feira, 25 de novembro de 2008

E se as Mulheres Governassem o Mundo...

...todos os problemas seriam resolvidos com um abraço de grupo, certo? A banda desenhada Y: The Last Man tende a discordar. Escrito por Brian K. Vaughan e ilustrado por Pia Guerra, esta série da editora Vertigo conta a história de Yorick Brow, único sobrevivente duma praga que dizima num só dia todos os organismos possuidores do cromossoma Y.


Acabei de comprar os primeiros 3 Volumes da série de 12 e fiquei rendido ao storytelling, à intriga ética e social com temáticas pós-apocalípticas. O escritor consegue, com génio, transformar uma comum fantasia masculina numa saga de terror e suspense: ser o único homem num mundo de mulheres. Porém como Yorick vai descobrir ao percorrer as ruas apinhadas de corpos em decomposição dos seus parceiros genéticos, o mundo está à beira da anarquia. Com várias facções a tentarem controlar a espécie em vias de extinção, diversos tipos de governos insurgem-se num esforço para agir civilizadamente. Mas a dura realidade traz sempre o pior do ser humano e as fanáticas Amazonas, um grupo de mulheres que acredita que os impuros homens foram mortos pela Terra Mãe, toma controla da população em histeria. Um excelente estudo sobre a dúbia condição humana, quer ela seja a busca incessante do poder ou a necessidade espiritual de encontrar consolo no irracional.


Muitos grupos feministas contudo não gostaram do modo como as mulheres são representadas nesta obra, na forma como enfrentam as circunstâncias dum mundo governado por elas. Mas creio que se a situação fosse inversa e todas as mulheres tivessem morrido, demoraria apenas dez minutos para que os homens dominantes lançassem bombas nucleares uns aos outros, num glorioso barbecue explosivo. E a banda desenhada acabaria em 20 páginas. Este é realmente o melhor cenário.


Sem dúvida das melhores bandas desenhas de tempos recentes, um trabalho de ficção-cientifica simples no conceito mas eficiente na forma de narrar e ilustrar uma história tão sinistra em termos éticos. É de afirmar que uma das melhores obras cinematográficas deste ano não é um filme.

Nuno Soler

Saw



Uma vénia a Leigh Whannell, que me proporcionou, nos últimos dois dias, algumas horas de um muito bom entretenimento, que dá pelo nome de Saw.

Num panorama que se começa a tornar repetitivo (os clichés do terror e do thriller), esta saga está divinalmente bem engendrada, todas as peças do puzzle vão colando, dando a entender que nada nos é dado ao acaso (fazendo assim juz ao nome dado ao serial killer, Jigsaw).

A premissa é simples: o homem que, devastado pelas vicissitudes da vida, se perde dele mesmo, passando o seu tempo a observar os outros à sua volta, acabando por achar que os salva se os puser à prova em jogos verdadeiramente perigosos e complexos, que se baseiam no poder de escolha (live or die); aqueles que decidirem passar pelo teste, caso sejam bem sucedidos, passarão a dar mais valor à sua vida.

Como se costuma dizer, "não há amor como o primeiro". Aplica-se perfeitamente a Saw, que pela originalidade e genialidade do argumento, constituiu uma novidade estrondosa. Os outros não deixam de ser muito razoáveis, mas não lhe chegam aos calcanhares.

A trama prende-nos de uma forma que, mesmo em cenas de extrema violência (tanto visual como psicológica), não conseguimos desligar de nada, com medo de perder algum elemento fundamental para a compreensão de tudo.

Todos os beats e turning points são fortíssimos, todos justificáveis e o factor-surpresa tem efeitos devastadores, servindo de turning point para o filme que se lhe segue (Saw II).

Para quem gosta de puzzles mentais e puxar pela cabeça, passem dois dias como eu passei: um cobertor, um sofá confortável e os Saw.




Sara Toscano

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Somewhere Over The Rainbow



Vejo algo sobre o Arco-Íris. Uma estrada de tijolos amarelos. Uma estrada que serpenteia com deliciosas oportunidades e visões. Vejo parceiros aventureiros, apaixonados pela mesma amante que me consume.

E tal como um cobarde sem cérebro e coração sou incapaz de balbuciar o mais simples dos obrigados.

Espero fazer-vos justiça e que demorem a ver o erro que foi ao convidar-me.

Enquanto isso desfrutarei da vista sobre o arco-íris.

Nuno Soler

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Ensaio Sobre a Cegueira Pelos Olhos de Fernando Meirelles



O recente Ensaio Sobre a Cegueira de Fernando Meirelles, baseado na obra homónima de José Saramago, é, ironicamente, um filme com uma visão diferente, fria, dura, quase cruel.
Quando digo "visão", refiro-me precisamente à forma do realizador desconstruir todo um código visual de planos aos quais estamos tão habituados.

Na verdade, faz todo o sentido. Quando um realizador faz um filme, coloca a câmara tendo em conta o olhar das personagens, as linhas de força, os eixos. Num diálogo, todos estamos habituados ao famoso campo/contracampo. Mas nada disto poderia ser feito num filme onde os personagens são cegos. Este seria, aparentemente, o maior dilema de Fernando Meirelles.

A fuga à escala clássica de planos, o desfoque e a saturação das cores frias foi, sem sombra de dúvida, a solução ideal para o problema dos pontos-de-vista. Para além do mais, enchem de significado o desenrolar do enredo e imprimem uma marca muito pessoal ao filme.

É um filme que vive da força das imagens. E é isso mesmo que faz de Fernando Meirelles um realizador fora de série (a capacidade extenuante de encher de sentimento todos aqueles planos, contando-nos uma história que vive essencialmente daquelas imagens tão fortes, tão vivas).

O Ensaio Sobre a Cegueira é uma obra de arte.




Sara Toscano