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quinta-feira, 3 de abril de 2008

The Mist - Nevoeiro Misterioso (parte II)

Depois de ler a crítica do Francisco ao filme e de já ansiar pela sua estreia, fiquei ainda mais curioso sobre como seria caminhar por aquele denso nevoeiro. Após ter saído da sala de cinema, sei que…

…“The Mist” é o que um filme de terror deve ser – negro, tenso e pontuado com o sangue suficiente de maneira a que o espectador mantenha em alerta todos os seus reflexos e sentidos. O realizador Frank Darabont conseguiu produzir uma obra acerca de paranóia, fanatismo religioso e falta de esperança, que pôs para segundo plano (e muito bem!) os monstros que aterrorizam o filme. De facto, o final do filme é tão descomprometido com a obra de Stephen King que só se pode assumir que Darabont teve rédea livre (em conjunto com o autor) para trabalhar nesse final.


The Mist” é a quarta adaptação cinematográfica que o realizador faz dos romances de Stephen King mas é, de entre eles, o mais virado para o terror - “The Shawshank Redemption (1994) e “The Green Mile” (1999) fogem completamente à temática de terror que domina os romances de King. O que é bem feito (e também o que o autor pretendeu quando escreveu o livro) é o foco dado às personagens e o evoluir das relações entre elas, mais do que propriamente pôr sangue extra no ecrã ou mostrar monstros mais evoluídos do que até agora temos visto. Pelo final do filme, perguntamo-nos quem serão os mais perigosos e selvagens, se os monstros ou se os humanos.


Em muitas partes faz lembrar “Aliens” (James Cameron, 1986), não só na psicologia das personagens, em que o ser humano pode ser mais perigoso que um pesadelo que o aterroriza, mas também na estética, quando as crias de monstros são expulsas dos casulos que fazem dos corpos humanos capturados.


A maior parte do filme passa-se dentro do supermercado, onde as pessoas estão encurraladas. Aterrorizadas, acabam por se dividir em dois grupos: aquele, liderado por Mrs Comody (Marcia Gay Harden – que interpretação estrondosa!), que acredita no nevoeiro ser um castigo bíblico; e o outro, liderado por David (Thomas Jane – o herói por necessidade) que sabe haver monstros lá fora, mas que rezar não será a sua salvação.


Os efeitos especiais tanto são poderosos como uma fraqueza. Mas a força que guia o filme está na atmosfera criada. Faz lembrar (faz lembrar tantos filmes!) “The Birds” (Alfred Hitchcock, 1963) ou “The Thing” (John Carpenter, 1982). Ambos decorrem em ambientes claustrofóbicos onde, perante a catástrofe, se revela o melhor e o pior do ser humano. Depois de todo o filme, da tensão, do desenrolar da história, não deixa de ser surpreendente o final que, ao som dos Dead Can Dance (“The Host of Seraphim”), nos faz abrir a boca de espanto e arruma completamente todos os filmes de ficção científica que, repletos de lugares-comuns, acabam sempre por… Mais não conto. Há muito que não se via um filme de terror assim. É brilhante!


8/10


Pedro Xavier


quinta-feira, 27 de março de 2008

Esta semana no cinema...

O texto seguinte foi publicado no blog Deuxieme a 27 de Março de 2008, com o título: «Estreias da Semana».


NÃO ESTOU AÍ

O cinema é, como todas as artes, uma criação de risco. Por “risco” devo sublinhar todo o arrojo necessário que uma obra deve (ou devia) possuir para se elevar ou, no caso contrário, a falta do mesmo arrojo, que a condena a algo mediano ou mesmo medíocre. Estreia hoje, entre nós, um notável objecto cinematográfico, que nasce do desafio de um enorme risco artístico / pessoal / cultural. Não Estou Aí (I’m Not There no seu original) é o novíssimo filme de Todd Haynes, realizador de obras como Velvet Goldmine (fantástica incursão no mundo da perda de inocência, suspensa sobre o boom da cultura “glam-rock” dos anos 70) e Longe do Paraíso (uma revisitação surpreendente ao classicismo americano dos anos 50), e que se centra num dos maiores ícones da música e da América: o incontornável Bob Dylan.

Se o risco criativo da obra se apresenta já pela enorme complexidade da personagem e do seu peso e herança culturais, afirma-se de antemão que esta é a menor das questões. Haynes vai mais longe e dirige seis actores (Marcus Carl Franklin, Christian Bale, o recentemente falecido Heath Ledger, Cate Blanchett, Richard Gere e Ben Whishaw) no papel de Dylan, cada um representativo das múltiplas facetas deste lendário cantor e compositor, sejam elas de domínio público, privado e/ou fantasiado. Num espantoso mise en scène, Haynes desdobra Dylan no retrato único, onde realidade e fantasia se entrecruzam de forma brilhante, e confere-lhe um cunho biográfico alimentado tanto pela vida real de Dylan como pela sua imagem e histórias a si subjacentes, onde o mito popular e a iconografia se misturam com a veracidade de um homem de capacidades e maneiras tão exuberantes quanto extraordinárias.

Bob Dylan, poeta de intervenção que marcou gerações desde o início dos anos 60 até a actualidade, surge-nos através dos seus amigos (Joan Baez – famosa cantora - discretamente interpretada por Julianne Moore), dos seus fãs (equilibrados entre os que o contestam e os que o veneram), das mulheres da sua vida (onde Charlotte Gainsbourg brilha na pela de Claire) e sobretudo, pelo olhar de um país em plena (e constante) transformação: a América do Vietname, pós Geração Beat, adepta dos Blues, Jazz, do Rock e do Folk (onde Dylan se notabilizou primeiramente), onde o descrédito do poder político se aliava a problemas sociais como o racismo, a droga e a guerra.

Com um enorme poder e sensibilidade artística, Haynes leva-nos para uma viagem inesquecível às mais variadas facetas de um homem único, que travou lutas com a sua própria criação intelectual e o seu compromisso pessoal nas relações humanas que estabeleceu, minadas por um desejo de reclusão constante, de receios e de incompreensão. Oscilando entre um preto e branco magistral e uma cor tão resplandecente como a sua música, Haynes desdobra Dylan em seis corpos diferentes, numa realização estupenda possuidora de uma energia inventiva mas bem contida e devidamente medida para cada cena, em oposição ao formato videoclip que a sua anterior incursão musical (o já citado Velvet Goldmine, que este ano comemora já o seu décimo aniversário) adoptara.

Para além da visão de Haynes, a escolha deste improvável (mas grandioso) elenco é uma peça chave neste enorme labirinto humano, onde para além do destaque das prestações soberbas de Christian Bale (que simboliza Dylan no início da carreira e o mundo do folk, e mais tarde o “abraçar” a causa religiosa) e Heath Ledger (o seu lugar no cinema e a questão familiar centrada na sua mulher e filhas), existe uma “personagem” que vive por si só: Cate Blanchett revisita Dylan em ruptura com o folk e a guitarra acústica, ao aderir à sonoridade eléctrica e ao folk rock, enquanto é confrontado pelos seus fãs que se sentem traídos e ainda pela imprensa e as suas histórias. Blanchett reúne nesta interpretação algo de majestoso, de inigualável, de contornos formidáveis, que não se prendem somente com a questão de representar o sexo oposto, mas a juntar a isso se incluir um “acting” tão vivo e real do papel “do momento” em que ele vive, que faz desta sua interpretação, possivelmente, a melhor da sua carreira.

Contra todos os possíveis factores de criação versus realidade, a vida de Dylan está aqui, bem equilibrada entre verdades absolutas e um hipnótico mundo onírico. Importa ainda relembrar que, neste jogo de máscaras, a juntar a estes seis corpos, Haynes termina o filme com uma imagem do sétimo: o próprio Bob Dylan, que na verdade se chama Robert Allen Zimmerman. Pelos vistos, afinal, os disfarces começaram muito antes do filme, que é absolutamente obrigatório.

5 / 5


Outras Estreias:


NEVOEIRO MISTERIOSO

Frank Darabont (À Espera de Um Milagre) mergulha no cinema de terror, com um fabuloso filme impróprio para cardíacos, que conta a história de David Drayton (Thomas Jane) e o seu pequeno filho que se encontram, entre o largo grupo de habitantes da mesma vila (destaque para a brilhante Marcia Gay Harden), fechados na mercearia local cercada por uma neblina estranha, que esconde uma ameaça terrível. Contra todos os esforços, as resistências acabam por ceder – quer a nível “mutante” como humano, e a luta pela sobrevivência torna-se ainda mais difícil. Cruzando influências de filmes série B, com a lição de John Carpenter bem estudada, e fortemente apoiado no romance de Stephen King em que o argumento se baseia, Darabont fornece-nos duas horas de grande cinema, onde a condição humana e os fantasmas da América se debatem com estranhas criaturas mortíferas que tomam de assalto, sem razão aparente, o mais comum dos mortais. Hitchcock ficaria orgulhoso.

4 / 5


NUNCA É TARDE DEMAIS

Edward Cole (Jack Nicholson) é um executivo milionário que se cruza com Carter Chambers (Morgan Freeman), um mecânico de classe baixa, numa improvável slada de hospital. Unidos pelo fatal destino de uma doença terminal, decidem juntos passar o que lhes resta da vida a concretizar tudo aquilo que sempre desejaram mas não conseguiram. Nesta viagem de combate à tristeza, a realidade dos problemas pessoais de cada um cruza-se com própria celebração da vida e da aceitação do que cada pessoa é por si mesma. Num registo muito simpático, Nicholson e Freeman fazem uma dupla inteligente e apelativa, mas apesar da bondade da mensagem, a força do drama não consegue imperar sobre a moral já explorada e evidente com que o filme se alimenta, para além de sobreviver com uma realização mediana, desprovida de registos de interpretação que deixem marca, algo que dois gigantes como Nicholson e Freeman o sabem fazer sem qualquer tipo de esforço. Ainda assim é um objecto bem articulado, que cumpre aquilo que promete, de forma muito eficaz.

3 / 5


ENTREVISTA

O auto-destrutivo jornalista Pierre Peders (Steve Buscemi), experiente em política e situações de guerra, vê-se a braços com uma despromoção no seu serviço, que o leva, contra a sua vontade, a entrevistar a famosa estrela de séries de televisão Katya (Sienna Miller), e sob um aparente desinteresse entre ambos, estabelece-se uma curiosa relação de cumplicidade que se revela demasiadamente pessoal e… fatal. Baseado no filme de 2003 com o mesmo título, realizado por Theo Van Gogh - um jornalista assassinado em 2004 por um fundamentalista furioso com o visão do Islão que o cineasta mostrou num dos seus filmes – Buscemi, amigo e admirador de Van Gogh, revitaliza a obra anterior, com o mesmo argumento, e fornece-nos um verdadeiro tour de force, contado em 90 minutos e tendo como base o apartamento da actriz, onde cinema e teatro se encontram de forma graciosa, seja pela técnica artística ou pelo fantástico uso de máscaras entre os personagens. Um grande filme a ver, onde Sienna Miller revela porque é uma das grandes actrizes da actualidade.

4 / 5

Francisco Toscano Silva