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Pedro Xavier
arte revisitada
Blow Up – A História de um Fotógrafo foi o único sucesso comercial de Antonioni. Ganhou o primeiro prémio em Cannes, a Palma de Ouro, o prémio de melhor filme da National Society of Film Critics e nomeações para o Oscar de Melhor Realizador e Argumento.
Através da máquina fotográfica (ou, caso se queira, através da câmara de Antonioni), há a descoberta do motivo, há a falsa sugestão de se resolver um crime e o impacto da dedução errada. O fotógrafo Thomas (David Hemmings) é um fotógrafo profissional de grande sucesso. No seu estúdio fotografa a modelo Verushka. Tal como se vê na imagem, imitam os rituais de namoro e acasalamento de homens e mulheres, mas a relação a transitória e falsa, tal como tudo o que lhe acontece. Thomas demonstra uma falta de interesse por tudo o que lhe rodeia: um álbum de fotografias inacabado; sessões de fotografia a modelos de ressaca; adolescentes que querem ser modelos; sexo oferecido em troca de um misterioso rolo de fotografias.
É partir disto que Thomas ganha algum alento para a sua vida (bebe, droga-se permanentemente e é supostamente divorciado?). Por não saber o que contém o rolo que fotografou, revela as fotografias e amplia-as (blow up). Um factor de destaque é o da tecnologia e a sua incerteza. A dita permite ao protagonista invadir a privacidade alheia, moralmente condenável. No entanto, o artista ou a personagem é forçada a ver ou a questionar-se se o que realmente viu aconteceu. Daí que o seu quarto escuro se torne numa lente de ampliação da realidade.
O texto seguinte foi publicado no blog Deuxieme a 25 de Julho de 2008, com o título: «Estreias da Semana».
O CAVALEIRO DAS TREVAS
A segunda aventura de Batman, novamente concebida pelo olhar de Christopher Nolan, é um objecto que rebenta – literalmente – com todas as ideias e barreiras de conceito da personagem, do seu universo e da adaptação cinematográfica de BD. “O Cavaleiro das Trevas” encaixa na perfeição, sem perder tempo com apresentações, no encadeamento de “Batman – O Início”, (um dos filmes maiores de 2005, munido de fazer um reset ao passado do herói, alimentado anteriormente pelo delicioso expressionismo gótico de Tim Burton e pelos duvidosos circos de néon de Joel Schumacher) e consegue a soberba proeza de ultrapassar todas as qualidades do capítulo anterior, resultando numa magnífica sequela, em tudo superior.
Estamos, garantidamente, perante “a encenação cinematográfica definitiva do Homem-Morcego”, como Jorge Mourinha escreve hoje no Público. De facto, “O Cavaleiro das Trevas” é um novo passo no mundo de Batman e do cinema dos super-heróis, onde tudo gira em Gotham City, uma metrópole com identidade própria, que surge como pano de fundo da acção, e que é tomada de assalto pela personificação do mal absoluto, tornando-se num palco de luta entre o bem e o mal (parecenças com Heat não surgem à toa e são justamente bem empregues), onde o medo e o caos iniciam a sua proliferação pelas mentes e corpos dos cidadãos, que discutem os termos de justiça entre si mesmos e não com as autoridades, que questionam continuamente.
Existem dois vértices vitais na composição d’ “O Cavaleiro das Trevas”. O primeiro manifesta-se claramente – e num grau de importância superior – nos seus criadores, a dupla dos irmãos Nolan. Jonathan e Chris escreveram o guião, no curto espaço de um ano, com uma noção de dramaturgia e tragédia acima do normal, e que se exprime em dois importantes pontos: o facto de terem composto esses elementos em personagens oriundas da BD, ao mesmo nível com que exploram tudo isso numa base real, num subtil tom pós 11 de Setembro e que pinta soberbamente a realidade em que vivemos e onde as personagens dos comics também mostram ter lugar. Para além da força estrutural do guião, é de salientar a sóbria, mas imponente, realização de Chris, onde o mais curioso ponto de análise surge numa mudança de estilo face ao capítulo anterior (uma mise-en-scène mais clara e elaborada, um ritmo mais pausado e planos verdadeiramente saídos de vinhetas da BD) e no uso da cor (o castanho ferrugento d’ O Início é aqui substituído por um azul hipnótico, e a grandiosidade da acção e a visão caótica e violenta do espaço urbano remete-nos para o melhor de Michael Mann).
O segundo vértice deste capítulo estende-se ao brilhante trio de personagens principal. Batman é-nos trazido uma vez mais por Christian Bale, que veste e acompanha, com naturalidade e segurança, a maturidade da pele do Homem-Morcego, e que vive aqui dias de amargura e um teste à sua força interior, nunca antes explorado. O seu sentido de justiça e motivação incorruptível mantém-se a todo o custo, mas isso e a obsessão por uma vida normal vão levar consigo um preço muito elevado. Na mesma estrada, encontramos do lado oposto o maior vilão de sempre: Joker, interpretado pelo falecido Heath Ledger. Sem exageros, confirma-se que Ledger é verdadeiramente assombroso, genial, abismal; falamos de uma das maiores composições de uma personagem dos últimos 25 anos (ao nível de um Hannibal Lecter), ele é o rosto maior do caos e da anarquia, e também é, sem dúvida, a maior encarnação de Joker do grande ecrã (sem menosprezo pelo fabuloso Jack Nicholson), que testa constantemente a identidade e sanidade de Batman. Para além do brilhante trabalho do actor, é formidável a forma como ele nos surge e como se mostra; cada origem das suas cicatrizes remete-nos para um passado turbulento e sombrio (curiosamente relativo a comics tão conhecidas como o caso de Piada Mortal, na história da esposa), que funciona perfeitamente para concebermos a deturpada existência do personagem, sem que seja necessário mostrar flashbacks ou utilizar outros meios e quebrar a soberba narrativa, o que nos mostra o Joker como “pleno e absoluto”, pelas próprias palavras de Chris Nolan (Sam Raimi que olhe bem para este exemplo no futuro). Por fim, Harvey “Duas Caras” Dent, surpreendentemente interpretado por Aaron Eckhart, é uma personagem de enorme força ao longo de todo o filme. Falamos de si num registo de tragédia grega, onde a sua perda, sofrimento e transformação valem a Eckhart um dos seus melhores momentos no cinema até hoje. O final dúbio da sua existência não deixa de valorizar o seu lugar numa cidade corrupta e refém do mal, onde o sacrifício se apodera dos inocentes e dos mais bravos.
Ao olharmos para este leque de mentes atormentadas, verificamos que estas 3 peças vivem interligadas entre si, de uma forma indissociável; se olharmos perto, Batman e Joker são duas faces da mesma moeda – uma infância traumática e abusiva – que se verifica uma linha ténue sobre a fronteira entre o bem e o mal, culpada pelo nascimento de Harvey “Duas Caras” Dent (seja pela malvadez aliciante de Joker como pela inacção de Batman); ao mesmo tempo temos a proeminente questão do nosso herói se debater ferozmente com as “duas caras” da sua própria existência, ao questionar (em conjunto com a cidade que o viu nascer) a sua missão de justiceiro, em simultâneo com o seu lugar de homem que nela quer viver – todos estes dilemas e mistérios, ainda que irónicos, são tudo menos inocentes, e resultam de uma forma absolutamente notável e eficaz, e que pedem ao filme uma segunda ou terceira revisitação, que se torna mais rica.
São inúmeros os momentos fenomenais deste filme, mas entre eles destacam-se o interrogatório a Joker, a conversa de Joker com Harvey no Hospital e ainda o encontro final entre Batman e Joker. Além disso, Hans Zimmer e James Newton Howard compõem uma banda sonora de enorme peso (o tema do Joker é assustador), Nolan filma como poucos, o elenco é todo ele fabuloso (ainda que a beleza e inocência de Katie Holmes não seja igualada por Maggie Gyllenhall, que é, apesar disso, muito competente), o argumento é negro, sólido e complexo e os fardos a carregar são cada vez mais pesados, numa Gotham que está a saque. A maior graça é que tudo isto está a ser “vendido” às massas como um blockbuster mainstream, mas na verdade é tudo, mas mesmo tudo, menos isso.
Em suma, para além de um verdadeiro épico mascarado de rostos grotescos e almas feridas (onde os géneros noir, policial e thriller se misturam avidamente), Christopher Nolan vai mais longe ao elevar a missão de Batman a um julgamento – até que ponto pode coexistir a justiça institucionalizada com a pessoal, e o que o separa do Joker além dos motivos – e dá-nos um enorme tratado sobre a vingança e as noções de perdão e sacrifício, tão sombriamente encaradas ao longo de duas horas e meia de grande cinema, onde a força da BD se mistura com a problemática realidade do terrorismo global, e que culmina num negro e poderoso final. Uma obra-prima.
Francisco Toscano Silva
O primeiro instinto de Léon é ver-se livre da rapariga, mas não como está acostumado a fazer. Os dois acabam por ficar juntos, a aprender um com o outro. Léon ensina Mathilda a limpar a arma e ela ensina-o a ler e a escrever; ele ensina-a sobre a morte, ela ensina-o sobre a vida. Ele é um rapaz dentro de um corpo adulto, ela uma mulher no corpo de rapariga. Foi devido a este bailado, a esta interacção quase sexual entre as duas personagens que Léon não foi tão bem recebido pela crítica americana, no entanto, o romance proibido já antes tinha sido abordado em Lolita e a exploração de carácter sexual em Taxi Driver.
Poderá não existir outro poster tão enigmático como o filme que representa. O que representa um olho? E o feto humano? 2001: Uma Odisseia no Espaço foi, é e continuará a ser um filme absolutamente intemporal na sua vertente filosófica, metafísica ou mesmo transcendente. Um dos maiores desafios com que Stanley Kubrick se deparou na pré-produção foi como encontrar maneira de representar coisas que nunca antes tinham sido vistas. Foi depois de ver o documentário apresentado pela NASA, To the Moon and Beyond, que Kubrick reuniu a equipa de produção para avançarem para a realização dos efeitos especiais do filme (Oscar de 1968).
Apesar de Kubrick e Arthur C. Clarke trabalharem em separado, respectivamente, na elaboração do argumento e do livro de título homónimo, ambos se reuniam permanentemente para criarem um todo coeso. Em resumo, a história reunida teve como missão criar um poema visual sobre a evolução do Homem. Muitas das cenas com diálogos e cenas que representavam a vida dos astronautas foram cortadas ao longo da produção e, por isso, 2001: A Space Odyssey é um filme não-verbal, um filme intelectualmente verbalizado de forma poética e filosófica.
Uma das questões que o filme levanta, é acerca da natureza humana. O filme termina com o olhar enigmático e ambíguo do Feto Astral - um olhar sobre a Terra. Tal como acaba, o filme inicia com o início da Terra, perdoe-se o pleonasmo, o amanhecer do Homem: o macaco assassino que mata na luta por um poço de água e pela sobrevivência do seu grupo. E a questão põe-se: irá o Homem mudar ou continuar igual?
Em 1962, o fotógrafo Bert Stern (fotógrafo do poster do filme Lolita) tirou uma série de fotografias a Marilyn Monroe que, no seu conjunto, ficaram conhecidas como "The Last Sitting". As fotos foram tiradas em várias sessões no Hotel Bel-Air e são, sem qualquer dúvida, as mais famosas imagens da actriz mais conhecida da América. Seis semanas após terem sido tiradas, Marilyn foi encontrada morta, devido a uma overdose.
Quarenta e seis anos depois, Stern recriou as famosas fotos mas com outra actriz igualmente famosa (não pelos seus atributos artísticos). Lindsay Lohan re-encarna a persona mais extravagante e erótica que havia em Marilyn, num atributo e numa representação iconográfica da importância atribuída pelo pensamento contemporâneo aos mártires da história americana.
As fotos podem ser vistas aqui.
No entanto, vendo o panorama geral a frio, não se pode deixar de dar importância à opção (2). Tal como o tecido do destino, o argumento (Michael Brandt) está repleto de buracos. Falta-lhes dar seguimento, desenvolvimento, profundidade, história, uma relação amorosa. Parece uma novela onde afinal “o meu pai eras tu?” e só falta encontrar uma meia-irmã no final. As personagens, à excepção da de James McAvoy (que bem podia ter sido aproveitada para um filme independente sobre a depressão da moderna american way of life), não têm qualquer carisma: Angelina Jolie está de regresso aos papéis ocos como em Lara Croft ou como em Gone in Sixty Seconds; Morgan Freeman bem se podia ter mantido a fazer de detective (Seven) ou de prisioneiro (Os Condenados de Shawshank) - não se entende como veio aqui parar nem como o seu papel de “chefe” vai intensificar a intriga se não há qualquer duelo; os outros todos são uns canastrões.