Não deixa de ser desconcertante a falta de atenção que Portugal dá ao chamado cinema independente e de autor. A ideia (um estigma) de que tudo o que não vier de Hollywood é maçador, chato e, consequentemente, irrelevante, tornou-se numa banalidade profunda, que dificilmente será superada. Pior ainda é quando essa mentalidade (público, distribuidoras, comentadores) se estende ao cinema americano, não à grande máquina que é Hollywood, mas à pequena, a que ainda produz cinema de qualidade através, maioritariamente, dos argumentos e das performances dos actores.Este é o caso de The Savages, nomeado pela academia para a cerimónia deste ano em duas categorias principais (Melhor Actriz Principal e Melhor Argumento Original) – um filme completamente ignorado (disponível em Portugal apenas em DVD) e que está, sem qualquer dúvida, acima da qualidade mediana que caracteriza a grande maioria do cinema produzido nos dias de hoje.

Wendy Savage e Jon Savage (Laura Linney e Philip Seymour Hoffman) são os filhos de meia-idade cuja relação entre eles e o pai leva até ao limite a própria definição de família (mais precisamente a definição de adulto). Tamara Jenkins, apesar de nos esfregar na cara os sintomas da demência, não deixa de apresentar uma tristeza melancólica, consciente de que nestas questões, a morte e a pena andam de mão dada com a comédia negra.
A morte, como tema central, já foi tornada num lugar-comum, no entanto não deixa de ser uma assombração no sótão de cada um de nós. A maioria dos filmes torna-a num inimigo sem rosto, a qual se deve lutar e resistir. N’ Os Savages e n’O Escafandro e a Borboleta, a mortalidade é levada a sério como sendo inevitável e que se deve aceitar.
N’ Os Savages, apesar da grande performance física de Philip Bosco, é no seu núcleo uma história sobre os dois irmãos que falham permanentemente, quer na vida pessoal, quer nos cuidados ao pai. Laura Linney porta-se lindamente como mulher à beira de um ataque de nervos sendo, no entanto, uma mulher criança incapaz de assumir qualquer tipo de compromisso a nível pessoal. Jenkins não é sentimentalista nem condescendente com as suas personagens (importando uma expressão típica americana, são uns losers). Philip Seymour Hoffman afirma-se, mais uma vez, como um dos maiores actores contemporâneos dando forma e vida a um professor de filosofia que, à semelhança da irmã, é incapaz de terminar um livro sobre Brecht e impotente quanto à resolução da sua vida amorosa. A peça semi-autobiográfica de Wendy Savage “Wake Me When It’s Over” é finalmente completa quando o pai morre.

Pedro Xavier


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