terça-feira, 29 de abril de 2008

Novos olhares sobre as Trevas

O texto seguinte foi publicado no blog Deuxieme a 29 de Abril de 2008, com o título: «A Força dos Cartazes».



Eis que nos chegam mais posters do tão aguardado The Dark Knight. Após a morte trágica de Heath Ledger, a Warner Bros fez uma enorme revisão sobre a publicidade e marketing do filme, uma vez que este se centrava na sua maioria na personagem de Joker, que o actor interpreta. Como tal, o site oficial manifestou um "silêncio", concedido em homenagem à morte prematura de Ledger, que ainda hoje se mantém nesse sentido. No entanto, aqui se encontram novas imagens, divulgadas por outros sites igualmente oficiais como este, que mostram pouco mas que prometem muito (o que é algo soberbo e tão raro nestes dias), e que futuramente vão encher os mais variados espaços de cinema físicos e virtuais. Seja como for, Joker mantém-se como um dos principais - senão o principal - motivo(s) de curiosidade desta nova aventura de Batman, cuja história já se fazia adivinhar no final do brilhante Batman - O Início, também realizado por Christopher Nolan.


Seja sob a forma de recuperar os rostos das personagens como chave vital do filme ou, ainda, numa lógica de revitalizar um toque mais negro e satírico já concebido anteriormente (o cartaz acima com as três faces - Joker, Batman e Harvey Dent - remete-nos irremediavelmente para...

...um dos cartazes desse fabuloso freak show chamado Batman Regressa, que Tim Burton realizou em 1992), certo é que, à medida que o tempo passa (e já falta pouco para a estreia: 18 de Julho nos EUA, 24 de Julho em Portugal) tudo ganha mais sabor, mas menos forma concreta; eis a riqueza destas novas imagens: o factor surpresa ganha pontos, e a curiosidade está mesmo prestes a matar o gato.

Francisco Toscano Silva

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Num buraco do chão...

Num buraco do chão vivia um hobbit.” – J.R.R. Tolkien


Foi a partir desta frase que John Ronald Reuel Tolkien (1882-1973) começou o manuscrito que viria a dar origem, com mais ou menos peripécias, a uma das mais conhecidas histórias da literatura mundial. Em 1937, veria publicada a primeira edição de “O Hobbit”, a história que conta as aventuras de um pequeno hobbit, Bilbo Baggins, e pelo achar do anel do poder. Os hobbits caracterizam-se por serem, fundamentalmente, uma raça de gente pequenina, com cerca de metade de tamanho humano, pés peludos e um (enorme) fraquinho por comes e bebes. Bilbo, encorajado por Gandalf (deve-se ler «obrigado por»), sai da sua casa no Fundo do Saco, no Shire, e parte com um grupo de anões que tenta recuperar o seu tesouro das garras de um dragão, por ventura o último da sua espécie.


Foi a partir desta premissa que o realizador Guillermo del Toro - “Blade II”, “Hellboy”, “El Laberinto del Fauno” – aceitou o desafio do produtor Peter Jackson para dar à luz do dia a obra de Tolkien. Numa entrevista que se pode ler aqui, del Toro revela, entre outras coisas, que a história do pequeno hobbit será dividida em dois capítulos (estreias previstas para 2010 e 2011) e contará já com Ian McKellen (Gandalf), Andy Serkis (Gollum), Howard Shore (banda sonora) e a empresa WETA Digital (efeitos especiais). Tendo todos dado prova de indiscutível sucesso, não é de ficar ansiosamente à espera?


Pedro Xavier


domingo, 27 de abril de 2008

Poster - The Thing (1982)

No mesmo ano de "E.T. - O Extra-Terrestre" (Steven Spielberg) e de "Blade Runner" (Ridley Scott), John Carpenter, depois de nos ter assustado com "Halloween" (1978) e "The Fog" (1980) - que teve um remake com o mesmo título em 2005 - apresentou-nos "The Thing - Veio de Outro Mundo", um dos filmes que a meu ver é um dos melhores do realizador.

"Veio de Outro Mundo", por debaixo da camada estilizada de filmes do tipo série B dos anos 80, incide, quase imediatamente e sem cerimónias, na claustrofobia e no medo existencial. Quando um grupo de cientistas - Kurt Russel é a personagem principal - se vê rodeado, numa isolada estação cientifica da Antárctica , por uma estranha forma de vida que veio do espaço e tomam consciência que não a podem deixar escapar para o mundo exterior, tornam-se progressivamente paranóicos, por nunca saberem qual dos amigos/colegas de trabalho terá sido vítima d'A Coisa. Aliás, a temática da invasão dos corpos por outros seres tornou-se muito recorrente no cinema apresentado na década de 1980, especialmente no que combina o género de terror com o de ficção científica.

Por esta razão, "Veio de Outro Mundo" entra para a colecção dos posters da semana, numa imagem messiânica/apocalíptica, onde é mostrado o relevo do herói subjugado pelo terror.

Pedro Xavier

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Esta Semana no Cinema...

O texto seguinte foi publicado no blog Deuxieme a 24 de Abril de 2008, com o título: «Estreias da Semana».


BLADE RUNNER - PERIGO IMINENTE: VERSÃO FINAL

Completados 25 anos da sua estreia (comemorados em 2007), o intemporal e magistral Blade Runner volta ao grande ecrã, desta vez na sua versão definitiva; digamos que a versão que Ridley Scott imaginou na totalidade. Esta nova edição (que se encontra já a venda em DVD no mercado) contém cenas extra, diálogos adicionais, um tratamento de remasterização da imagem e do som, e leva-nos para num desencantado futuro dominado pela alta tecnologia, onde Deckard (Harrison Ford soberbo), um ex-blade runner (polícia), se vê novamente a braços com uma perseguição a 6 andróides replicantes assassinos em fuga, com a missão de os exterminar da terra. Num combate sem igual, Deckard perde-se na violência da ironia "tecnológica" criada pelo próprio homem, enquanto se apaixona por uma misteriosa replicante que lhe custará um elevado preço moral e humano.

Filmado sobre o registo do melhor noir com toques ciberpunk (tão presentes nos mais variados artefactos culturais da sociedade actual), Blade Runner mantém, volvidos todos estes anos, uma frescura, beleza, originalidade e sobriedade absolutamente intocáveis, que o tornam num imaculado objecto de culto da sétima arte, e que figura em grandiosos lugares de qualquer selecção cinematográfica que se efectue. São incontáveis os momentos que ficam para sempre gravados no nosso imaginário, para além da fabulosa mise-en-scene, da riquíssima linguagem simbólica dos corpos (humanos e não humanos) e dos espaços - exemplos muito copiados até aos dias de hoje, poucas vezes bem conseguidos, mas sobretudo nunca ultrapassados. Para finalizar tudo isto, é ainda de notar que esta versão é, sem dúvida, uma mais valia na medida que consagra todo o argumento para um final de enorme força dramática, e que encaixa vários dados que se encontravam à deriva pelo filme, nas versões alternativas que foram comercializadas antes - tudo bate certo, para um novo e maior ponto de vista e análise. A visão de Ridley Scott e a imaginação de Philip K. Dick ganham aqui uma proporção, literalmente falando, do outro mundo, e a possibilidade de se visionar numa sala de cinema é, sem outra possível definição, um momento de pura magia irrepetível para qualquer cinéfilo que se preze. Absolutamente obrigatório, para ver e rever, vezes sem conta.

5/5


TUDO O QUE PERDEMOS

Após a ressaca dos Óscares e antes da avalanche dos blockbusters de Verão, existe ainda lugar para exemplos do melhor que o género dramático nos pode presentear. Neste tempo intermitente, é de louvar a realizadora dinamarquesa Susanne Bier, que nos traz uma arrojada e poderosa obra sobre a redenção e as formas frágeis onde o amor nasce. Sob a produção de Sam Mendes, Tudo o que Perdemos é um belíssimo drama que nos coloca no seio de uma família, composta por Audrey Burke e as suas filhas, inesperadamente atingidas pela morte de Brian, o marido/pai (singular David Duchovny). Perante uma nova realidade de contornos quase sufocantes, Audrey traça laços de amizade com Jerry Sunborne, um toxicodepente perdido, que era o melhor amigo de Brian desde a sua infância, e de quem Audrey nunca gostou. Num processo de "auto-salvação", Audrey lança-se para ajudar Jerry (ao pedir que se mude para viver na sua recuperada garagem), enquanto tenta sobreviver à tona, com as suas filhas, no enorme pesadelo da perda - sem imaginar que Jerry lhe irá mostrar, da forma mais difícil, o longo caminho da aceitação e redenção pessoais.

Numa narrativa linear (somente alimentada na primeira parte por flashbacks), ao longo de duas horas, tomamos parte do turbilhão de emoções que habitam nestes personagens, confusos entre sentimentos mas certos da sua orientação, que nos fazem viver momentos de grande cinema, onde Berry e Del Toro são brilhantes na representação dos espaços frágeis que habitam sobre o amor e a revolta, sempre bem suportados pelo grandioso trabalho de câmara de Bier, que nos remete para Bergman com os seus grandes planos, uma vez mais reveladores de que os rostos são uma matéria de enorme valor fílmico e humano. Juntamente com O Lado Selvagem e No Vale de Elah, este é um dos mais poderosos dramas que este ano nos trouxe até agora.

5/5


VESTIDA PARA CASAR

Esta semana temos também espaço para uma comédia romântica muito simpática. Vestida para Casar conta a história de Jane Nichols (Katherine Heigl, a fascinante Izzie de Anatomia de Grey), uma jovem que dedica grande parte da sua vida a olhar pelos outros e a marcar presença num momento importante das suas vidas, como o casamento; daí ela guardar religiosamente 27 vestidos de dama de honor, apesar de sonhar com o dia em que ocupe o lugar da noiva, para viver uma bela história de amor. Perante estes "actos beneméritos" com os seus mais chegados, Kevin Doyle (James Marsden), um jornalista descarado, descobre assim os ingredientes ideais para escrever uma bela estória, e aventura-se no caminho de Jane, que se encontra já marcado pela confusão que a sua irmã Tess (Malin Akerman) criou, ao roubar-lhe, inadvertidamente, o homem dos seus sonhos - o seu patrão (Edward Burns).

Com confiança e determinação, Anne Fletcher realiza um filme extremamente divertido, dotado de diálogos originais e carregados de bom humor, com uma mensagem bonita e que resulta num objecto de entretenimento inteligente. Para fixar fica a óptima prestação de Katherine Heigl (que desvenda, a par de Julia Roberts e Meg Ryan, uma sólida figura para registos futuros deste tipo) e alguns momentos bem concebidos, como o improvável, mas delicioso "Bennie and the Jets".

3/5


UNS ESPARTANOS DO PIOR

Se este ano já abarca consigo alguns títulos de medíocre e/ou duvidosa qualidade, eis que nos chega, até ao momento, o pior filme do ano. É doloroso classificar "isto" como "filme", pois não existe um pingo de cinema aqui dentro. Sobre a alçada das sagas Scary Movie e do recente Epic Movie, Uns Espartanos do Pior volta a combinar o cinema (dos últimos dois anos) e mistura-o com os podres da socialite americana. O resultado é um absoluto desastre, onde a simples paródia a títulos como 300, Uns Compadres do Pior, Rocky Balboa e Transformers não funciona nem sequer por 30 segundos.

Apesar disso, o pior concentra-se na seguinte questão: como se elabora um projecto destes numa filosofia de "tudo é possível e válido", até as mais importantes e basilares regras da sétima arte ficam por respeitar: ritmo narrativo é nulo, interpretações não existem, o argumento roça o mais ordinário e pueril dos tempos actuais, e não existe também qualquer noção de raccord (a cena da nudez cortada em três planos revela descaradamente um fato de banho, já para não falar nos microfones presentes em inúmeras cenas e de se ver, no poço da morte, o espaço onde as vítimas "caem", ao nível do solo), e note-se ainda um facto extraordinário que é a necessidade constante de cada momento de paródia a algo ser devidamente identificado pelos actores (?), que indicam à força quem é a personagem, nessa altura. Sim, porque diga-se que ao verificar a silhueta dum boxeur com a cara de Stallone, semi-nu de calções, (onde até se encontra inscrito o nome do personagem) e de luvas postas, o espectador precisa ainda assim que a acção (?) seja suspensa para que os actores (?) soltem, num espanto mais farçola que os grunhidos dum filme pornográfico, um surpreendente "Rocky!". Um verdadeiro e atroz atestado de estupidez, até ao público menos exigente.

1/5 (só porque não usamos "bola preta".)

Francisco Toscano Silva

quarta-feira, 23 de abril de 2008

The Persistence of Time


É um dos títulos pelo qual é conhecido um dos mais famosos quadros de Salvador Dali - The Persistence of Memory. Inequivocamente, associado à memória está o conceito de tempo e se Dali, já nos anos 1930, fez representar relógios em forma de queijo Camembert, tornando o espaço temporal numa paisagem onírica, a obsessão pelo tempo (ou a falta dele) não se iria dissipar com o avançar das décadas. Quanto mais se fez, mais se quis fazer. Não houve tempo e continua a não haver o suficiente para satisfazer as necessidades prementes de um mundo em rápida mutação. Desta maneira, precisamente no ano Madonna, eis que surge “4 Minutes” o primeiro single do mais recente álbum da rainha da pop,Hard Candy”. Já em 2004 Gwen Stefani tinha apresentado "What You Waiting For", uma música que, abaixo da superficialidade da camada mainstream que dava ritmo à música, estava uma crítica intensa a toda uma indústria e a denúncia da pressão sofria pelos artistas para apressarem a sua genialidade, apenas com o intuito de… não perder tempo. Madonna e Justin Timberlake formam a dupla que apenas tem 4 minutos para salvar o mundo. Para quê mais?



Pedro Xavier


Poster - Lawrence of Arabia (1962)

"I pray that I may never see the desert again. Hear me, God." - T.E. Lawrence

O primeiro post deste blogue dedicado única e exclusivamente a um poster e a todas as memórias que trás, não podia deixar de ser uma referência a um dos maiores épicos de todos os tempos. Esta obra-prima de David Lean ("A Ponte Sobre o Rio Kwai", "Doutor Zhivago"), vencedora de 7 Oscars em 1963 (o outro peso-pesado era "To Kill a Mockingbird"), é baseada na vida do excêntrico oficial britânico T.E. Lawrence e na sua campanha contra os turcos na I Guerra Mundial. O filme, projectado originalmente para os 70mm, possuidor de imagens de grandiosidade espectacular e, até agora, irrepetíveis, aborda (em forma de crítica) a temática do colonialismo e o desconforto hipócrita da guerra. "Lawrence of Arabia" é um épico em todas as suas letras, uma projecção visual de um mito literário.

Pedro Xavier

terça-feira, 22 de abril de 2008

Curtas...

Devido à enorme quantidade de trabalho que neste momento tenho entre mãos (impedimento suficiente para aprofundar temas ou escrever artigos mais extensos), teremos posts mais breves, com notícias, imagens ou simplesmente pequenas curiosidades, que não têm de estar necessariamente interligados.

Já neste blogue tínhamos antes dado um cheirinho do novo Batman [ler artigo] e, agora, em primeira mão, temos a primeira crítica escrita em português (do Brasil) ao mais recente filme de Christopher Nolan, “The Dark Knight”, pela jornalista e escritora Ana Maria Bahiana.

Independentemente da opinião da autora, fica a impressão de que o novo filme de Batman (Christian Bale), centrado na personagem Joker (Heath Leadger), vai ser mais negro e sombrio, um estrondo ainda maior que o seu predecessor. Só por isto, é de ficar com água na boca…


Ler artigo aqui.


Do meio de toda a confusão da Internet e de tudo o que se pode encontrar, eis que chega a imagem da semana, a versão rock 'n roll de "Star Wars". O fenómeno que atingiu miúdos e graúdos, tem destas coisas.



Pedro Xavier


domingo, 20 de abril de 2008

Contrato

Contrato” é uma adaptação da obra de Dennis McShade, “Requiem para D. Quixote”, e o filme de estreia do versátil actor Nicolau Breyner na realização. Conta com nomes tão conhecidos do público português tais como Pedro Lima, Cláudia Vieira, Sofia Aparício, Vítor Norte, Pedro Granger e José Raposo. A personagem que irá, certamente, surpreender é a de José Wallenstein. O já veterano actor encarna o papel de um travesti que canta músicas da francesa Edith Piaf.


A rodagem demorou cerca de quatro semanas e passou pelos concelhos de Cascais, Sintra, Lisboa, Montijo e Mértola. “Contrato” promete ser, apenas pelas imagens do trailer, um dos melhores filmes de acção português dos últimos anos, que conta a história de um hitman (Pedro Lima) que se vê envolvido num enredo complexo que envolve máfia Nova Iorquina e o chefe da máfia ibérica Georgio Thanatos (Nicolau Breyner). Se isto não for chamariz suficiente, então encham-se as salas para ver Cláudia Veira despida.



Pedro Xavier

Enchanted / Uma História de Encantar (DVD)

Há aqueles filmes que são, nitidamente e inquestionavelmente, filmes de domingo à tarde, mais precisamente para aquelas tardes de domingo em que não apetece trabalhar, não apetecer estudar, não apetece sair de casa. Só apetece ficar recostado no sofá, a ver na TV o que as iluminadas almas da programação televisiva decidem ser, sem sombra para dúvida, um bom filme (ou se calhar um mau para fazer concorrência a um péssimo noutra estação). Foi com este espírito domingueiro que, para fugir ao sacrifício de me sujeitar à programação de outros, inseri no leitor de DVD um filme que, tendo passado despercebido (aos meus olhos), já entretanto me iam impingindo e que seria uma grande falha não o ver.

Enchanted / Uma História de Encantar” é, verdadeiramente, a mais recente e deliciosa produção da Disney que nos faz recordar de tempos idos, de uma era já quase esquecida, em que Walt e a sua equipa não conseguiam fazer nenhuma animação que não merecesse nota máxima. Em 1964, o filme “Mary Poppins” – cuja personagem homónima foi interpretada por Julie Andrews – fez a ligação, a ponte entre a animação e a realidade através de um musical verdadeiro e mágico. Era um dos filmes favoritos de Walt Disney e, penso eu, que certamente hoje estaria enamorado pela história da princesa perdida de “Enchanted”. Não é por acaso que Julie Andrews é a narradora do já tão típico (refira-se, esquecido) «Era Uma Vez» introdutório das histórias de encantar.



Ao realizador Kevin Lima e ao argumentista Bill Kelly pediam-se garras para lidarem com este híbrido - “Enchanted combina animação 2D, efeitos especiais e representação tradicional. Esta mistura, caso não fosse bem conduzida, poderia ser equiparada à queda de um elefante numa loja de porcelanas. Kevin Lima já tinha trabalhado em “A Bela e o Monstro”, “A Pequena Sereia” e “Aladino”, três das melhores animações da Disney.

A “História de Encantar” pode ser lida (o filme começa com um abrir de livro – que saudades!) tal e qual como outros clássicos, vejamos “Branca de Neve e os Sete Anões”. No prólogo, a solitária princesa Giselle (Amy Adams) de Andalusia, entoa para os seus amigos animais da floresta a canção que a fará ser encontrada pelo seu príncipe encantado, o portador do «true love’s kiss». O príncipe Edward (James Marsden) é corajoso e o par perfeito, mas os planos do casamento são arruinados pela madrasta má, a rainha Narissa (Susan Surandon num papel ainda mais maléfico que Cruella de Vil). Com receio de vir a perder o trono, Narissa empurra Giselle para um poço, que liga o mundo de fantasia ao mundo real (Nova Iorque), onde não há «happily ever afters». Já no mundo dos humanos, Giselle conhece Robert (Patrick Dempsey, Dr. McDreamy da série Anatomia de Grey) e a sua filha de seis anos Morgan (Rachel Covery). Depois a trama adensa-se quando Pip (o esquilo), Nathaniel (o ajudante da rainha), Edward e Narissa decidem seguir o mesmo caminho que Giselle, entrando no buraco do coelho.




Ah, como é refrescante ver que “Enchanted” tanto parodia as mais belas tradições da Disney como, ao mesmo tempo, as respeita e segue o seu rumo. São inúmeras as invocações às mais mágicas cenas dos clássicos da Disney que marcaram a infância de todos [galeria de fotos aqui]. Não há piadas nem sentimentalismos fáceis. Foi (re)encontrada a alquimia para a magia. Algures, onde quer que esteja, Walt Disney deve sorrir…

9/10

Pedro Xavier


sexta-feira, 18 de abril de 2008

Shyamalan, O Acontecimento

M. Night Shyamalan tornou-se um realizador que não garante o consenso quanto à sua obra realizada. Tanto atingiu, como se costuma dizer, os píncaros, como por ocasiões é deitado abaixo pela crítica, não só a nacional, como a internacional. Por um lado é odiado, por outro louvado como realmente inovador na arte de contar histórias através do grande ecrã.


A filmografia (só a partir de 1999) pode ser dividida em três partes distintas e inconfundíveis, no que diz respeito às reacções que provocaram: ) apenas tem lugar nesta listagem “The Sixth Sense / O Sexto Sentido” (1999), o filme que tirou Shyamalan do desconhecimento pela sua qualidade técnica, artística e por um guião estruturalmente forte, características essenciais para não se proceder à catalogação imediata na secção de maus filmes de terror; ) desta parte pertencem, saltando a ordem cronológica, “Unbreakable / O Protegido” (2000) e “The Village / A Vila” (2004). “Unbreakable” inicialmente foi recebido com alguma relutância por fugir à temática do terror - o que só prova que “Sexto Sentido” foi realmente estrondoso - rapidamente se tornou objecto onírico pela abordagem visceral ao universo dos comics.A Vila” é, sem dúvida alguma, a grande obra-prima de Shyamalan. Pode-se dizer que, no seu núcleo, voltamos à mesma temática. Há, pois, a abolição do mito em função do despertar da realidade pela criação de (mais uma vez) um herói. Shyamalan é hábil e pródigo ao guiar o espectador numa dada direcção, mudando-lhe o rumo à última da hora; ) Nesta última parte sobram “Signs / Sinais” (2002) e “Lady in the Water / Senhora da Água” (2006). Este último foi tomado como o pior da sua carreira, pelo pretensiosismo que muitos consideravam, incompreensivelmente, Shyamalan ter ganho.



É neste panorama que está planeado, já para o Verão, a estreia do mais recente filme do realizador. “The Happening / O Acontecimento” vai regressar, tal como em “Sinais”, à temática da catástrofe e aniquilação da raça humana (de onde virá a ameaça?). Irá decerto revelar algo mais abaixo da camada mainstream que cataloga este género. O filme conta com Mark Wahlberg no papel principal. Aqui fica o trailer, com a secreta esperança de que o filme se encaixe na segunda categoria acima referia.



Pedro Xavier

Revolução Cinética


Está actualmente no Museu Nacional de Arte Contemporânea - Museu do Chiado, a exposição Revolução Cinética, até 15 de Junho. Pela minha parte, recomendo vivamente. Além do mais, mediante a apresentação do cartão de estudante, a visita é à borla.

A exposição começa por uma apresentação, na Sala Polivalente, de um documentário do aclamado Brian De Palma - The Responsive Eye, que data de 1965. Foi filmado em 16mm, a preto e branco e com som. Tem a duração de 26 minutos.

Trata da célebre exposição homónima de Op Art, realizada no MoMA, em Nova Iorque. São registos fílmicos mais ou menos casuais, com uma câmara manual e entrevistas aos comissários, artistas e visitantes da exposição. Representa uma subtil sátira do ambiente da arte contemporânea.

Depois deste visionamento, e já no primeiro piso, há uma breve explicação do conceito de revolução cinética, em jeito de introdução ao que se lhe segue. Há, latente nesse conceito, uma consciência do papel do movimento na redefinição da concepção do objecto artístico. Há, também, uma fusão da espacialidade com a temporalidade que promove outra visualidade, diferente dos padrões culturais e psicológicos estabelecidos.

Após algumas vitrines de fotografias e três obras ilustrativas do que havia sido introduzido, pode assistir-se a um breve filme, de Pontus Hultén & Robert Breer, intitulado Le Mouvement. Data de 1955, filmado em 35mm, a preto e branco e sem som. São, basicamente, 15 minutos de uma mostra do trabalho de artistas convidados para fazer parte da conhecida exposição da Galerie Denise René. Entre eles, nomes como Duchamp, Calder, Agam, Bury e Tinguely.

Do resto da exposição, saliento os trabalhos expostos que mais me chamaram a atenção, seja esteticamente ou conceptualmente:

Progressão Cromática, de Gregorio Vardanega

GV 9 (em alumínio), de Ángel Duarte

Estrutura Animada de Deslocação Contínua, de Hugo Demarco

Rotorelief, de Marcel Duchamp (1935)

Relieve Luminoso, de Eusebio Sempere (1960)

Óptica Lumino-dinâmica, de Martha Boto (1966)

Mobile de Luz Contínua, de Julio Le Parc (1968)

Aparelho Metafísico de Meditação, de António Pedro (1935)

Estruturas, de Yaacov Agam (1954)

Quadrado, de Jesús Soto (1996)

Escrita Azul Central, de Jesús Soto (1999)

Movimento Cósmico, de Yaacov Agam (2006)

Foi uma pena verificar que Microtemps nº19 de Nicolas Schoffer se encontrava temporariamente desligado.

No meio destas obras, podemos ainda assistir a uma obra rara. De seu título Anémic Cinéma, esta obra de Marcel Duchamp (que data de 1925), é um filme experimental, feito na colaboração de Man Ray e Marc Allégret, e trata, analisado nos dias de hoje, da deslocação na função das relações entre texto e imagem. Uma verdadeira raridade, filmada em 16mm, a preto e branco, sem som e com a duração de 7 minutos e meio.

No final da exposição, no lado do café do museu, podemos experienciar uma última obra, com proporções muito maiores, sobre a qual não vou falar, para não estragar a surpresa. Posso apenas adiantar que se torna numa experiência deliciosa. Eu, pelo menos, sorri com muita satisfação.

Recomendo vivamente, para todas as idades.

Sara Toscano

terça-feira, 15 de abril de 2008

Blindness / Ensaio Sobre a Cegueira

Ficam aqui as primeiras imagens de “Blindness”, o novo filme de Fernando Meirelles, que adapta a obra do galardoado Prémio Nobel da Literatura (1998) José Saramago de título “Ensaio Sobre a Cegueira” [ler artigo]. Fernando Meirelles tornou-se conhecido pela realização do filme “Cidade de Deus” (2002), um importante filme de caracterização social da vida nas favelas brasileiras. Em 2005 pôs no grande ecrã a obra de John Le Carré, “The Constant Gardener/O Fiel Jardineiro”, que contou com quatro nomeações para os Oscar. Rachel Weisz ganhou o ambicionado galardão na categoria de Melhor Actriz Secundária. Antes de começar a produção de “Blindness”, Fernando Meirelles realizou ainda quatro episódios da série de TV “Cidade dos Homens” que, tal como em “Cidade de Deus” e em “Tropa de Elite” (José Padilha, 2007) [ler artigo], é abordada a mesma problemática. Até hoje Fernando Meirelles ainda não desiludiu. Espera-se que não comece agora.



Pedro Xavier


David Fonseca live @ Coliseu (parte III de III)

«Nunca percebi muito bem o conceito de inspiração. No dicionário aparecem algumas explicações, explicam a inspiração como uma sugestão, um entusiasmo criador ou uma insuflação divina. Mas o que inspira uma canção? De onde vem todo este som? Há quem diga que vem da raiva, da desilusão, do descontentamento, da revolta, há quem diga que vem do amor, do encantamento, do êxtase, da felicidade, do sexo, da fantasia, do inesperado, da surpresa, do choque, da calma. Eu acredito que a inspiração é uma das maiores mentiras da arte: não existe. O que existe é um mundo cheio de pessoas e coisas em constante mutação. Os meus olhos fixam aquilo que parece ser mais importante e depois tento concentrar esses pequenos retratos em canções. Gravo-as em mini cassetes onde quer que esteja e mais tarde, tento perceber as harmonias e melodias entre o ruído de fundo. De onde vem todo este som?» – David Fonseca

É já conhecendo o background do cantor pelos dois posts anteriores que chegamos finalmente ao dia do grande concerto, uma data que certamente nunca será esquecida pelos que estiveram na noite de 12 de Abril de 2008 no Coliseu dos Recreios, em Lisboa. Além disso, o cantor prepara o lançamento do concerto em formato DVD. A sala de Lisboa surge como o ponto alto da “Dreams in Colour Tour” que, tendo por base o último disco, já antes tinha passado pelas lojas FNAC e muitos cineteatros de todo o país.


Para abrir o concerto, actuou a pianista da banda de David Fonseca, Rita Pereira, sob o fantasioso nome artístico de Rita Redshoes [ler mais]. Não fugindo à regra, Rita tem realizado sempre as primeiras partes na “Dreams in Colour Tour”, aproveitando para dar a conhecer o seu primeiro álbum a solo “Golden Era”, editado este ano. Rita apresenta-se sempre de sapatos vermelhos, a contrastar com o vestido negro que habitualmente enverga. Não foi de negro, mas de um branco refrescante e luminoso, iluminando com a sua voz a sala já escura do Coliseu. Encantaram o público ‘Choose Love’, ‘Hey Tom’, ‘Your Waltz’ e a já badalada ‘Dream on Girl’. Influenciada pela música de David, Rita Redshoes está a tornar-se numa artista que pretende fugir à monotonia, apostando no uso de novos elementos sonoros para a criação de música. Despede-se do público com um «Até já», sinónimo de quem irá mais tarde satisfazer a vontade do público com um dueto em ‘Hold Still’, o mais conhecido single do álbum “Our Hearts Will Beat As One”, o segundo de David Fonseca a solo.


«Estamos a preparar um espectáculo muito específico para este dia. (...) Temos surpresas em grande para as pessoas que vão estar a assistir. (...) A ideia é (...) que possa ser não só um espectáculo sonoro mas visual (...) e que possa trazer algumas coisas inesperadas, mas que fazem parte da minha carreira e da minha forma de ver a música e de estar na música» - David Fonseca


Já por esta altura a sala nobre de Lisboa estava “quentinha” e ansiava-se pela entrada do mestre-de-cerimónias. O concerto começou com a projecção de um pequeno filme auto-biográfico, o primeiro de outros que lhe seguiriam, à semelhança dos webisódios. E é aqui que entra a inspiração da quote inicial do webisódio 2. Não há qualquer outro cantor deste pequeno rectângulo luso que faça e/ou tenha feito um espectáculo do mesmo género que foi apresentado na noite de 12 de Abril. David recorreu a diversos elementos cénicos para organizar o seu show: os tais pequenos filmes, stand-up comedy (para surpresa de muitos), reconversão (paródia) de pop hits contemporâneos e ainda uma introdução de mariachis. Consequentemente, os alicerces que sustentam a noção/ideia/estereótipo de concerto foram completamente abalados (senão mesmo abolidos). Não foi um «desfilar de canções», foram actos, como se de uma peça de teatro se tratasse. Daí que o que se assistiu não foi um concerto, foi um espectáculo, com princípio, meio e fim, e o público sempre a pedir mais.


Foram os tais mariachis que arrancaram pelo palco dentro e abriram as hostilidades com ‘4th Chance’, o título inicial de “Dreams in Colour”. Seguiram-se ‘Our Hearts Will Beat as One’, ‘Song to the Siren’, de Tim Buckley, e todas as outras que David já nos habituou, de entre elas, ‘Kiss Me, Oh Kiss Me’ sentado em cima do piano de Rita Pereira (agora era Pereira, Redshoes tinha ficado nos bastidores), ‘Superstars II’ (todo Coliseu assobiou a melodia) e ‘Silent Void’. Nesta última, David rodopiou na placa giratória no chão enquanto cantava pelo megafone que segurava, para júbilo do público.


Os pontos altos do show David Fonseca incidiram sobre três músicas de destaque: primeira, como não podia deixar de ser, no dueto em ‘Hold Still David sentou-se de costas voltadas para Rita e, antes de passarem as imagens de uma Londres triste e melancólica nos grandes ecrãs, pediu «cantem se souberem a letra». Não era preciso pedir, esta era daquelas que deitaria a casa abaixo; na segunda, ‘This Raging Light’, David virado para o público e destacado por um holofote concentrava as atenções do público em si, escondendo atrás do pano negro uma mudança radical no palco. Quando a batida da música se intensificou revelaram-se bolas espelhadas e dançarinos, estilo ‘Hung Up’ de Madonna; terceiro, foi ‘The 80’s’, intercalada pela ‘Video Killed the Radio Stars’, dos Buggles, que fez libertar a (restante) energia contida nos espectadores.


Não vale a pena falar das outras todas, todas eram conhecidas. Vale é a pena referir o medley, acompanhado por um pequeno órgão, de temas tão conhecidos, que David quando segue em viagem considera extremamente depressivos e tristes, quando atenta apenas à letra e não ao ritmo pop e colorido que lhes dá cor. Foram exemplo da paródia ‘Toxic’ (Britney Spears), ‘Maneater (Nelly Furtado) ou ‘Umbrella’ (Rihanna).


Houve ainda direito a um tema novo (‘Orange Tree’), a outro antigo (‘Angel Song’, dos Silence 4 – nesta altura David calou-se, cantou apenas o público) e ainda a podermos viajar pelos sonhos coloridos de David, quando este se deita numa cama para dormir e, ao acordar, todos os elementos da banda estão vestidos com fatiotas carnavalescas para apresentar os temas finais ‘Dreams in Colour’ e ‘A Little Respect’, que deu origem a um adeus (que tal um «até já»?) acompanhado por uma chuva de vermelhos corações de papel. Não foi um concerto, foi mesmo um espectáculo inspirado e sem igual.


Pedro Xavier


segunda-feira, 14 de abril de 2008

David Fonseca live @ Coliseu (parte II de III)

“Sempre que acabo um disco, há uma sensação estranha, vejo-o nas minhas mãos, observo-o ao pormenor, olho-o de todos os ângulos possíveis, assalta-me sempre a mesma sensação, dou por mim a dizer sempre a mesma frase: como é possível condensar tanto tempo, as semanas e meses de procura, as frustrações e as vitórias, os acontecimentos mais estranhos, as histórias mais impressionantes, tudo aqui? O disco chega às minhas mãos, pronto para ocupar um espaço, para acrescentar mais uma página àquilo que sou. E pela primeira vez, ouço-o como se não fosse meu, levo-o para longe do sítio que o viu nascer, levo-o a ver o mundo, e eu verei o mundo através dele.” – David Fonseca


Falar hoje em David Fonseca é falar em alguém com uma carreira musical que se afirma por si só. Por detrás da imagem de rapaz tímido das canções melancólicas e introspectivas dos tempos dos Silence 4, há um novo artista, agora numa fase musical mais colorida. “Silence Becomes It” e “Only Pain is Real” foram os discos editados pela banda de Leiria [David Fonseca na voz e guitarra, Sofia Lisboa na voz, Rui Costa no baixo e Tozé Pedrosa na bateria]. O primeiro tem dez anos, o segundo tem oito e em 2004 ainda foi lançado uma colectânea (2CD+DVD) dos espectáculos gravados ao vivo no Coliseu dos Recreios. A banda atingiu rapidamente o estrelato com os singlesBorrow’, ‘A Little Respect’, ‘My Friends’ e ‘Sing Me Something New’, tendo chegado ao ponto de ter sido convidada a actuar em vários locais na Europa.


Mas a banda não estava destinada, o estilo introspectivo, repleto de densidades negras e ambientes crus, não era algo que apelasse a uma continuação. O disco “Only Pain is Real”, comparado com o primeiro, foi uma completa desilusão, aproveitando-se uma ou duas músicas. Sentia-se que a formiga tinha dado um passo maior que a sua passada. Daí que David, o autor das letras e compositor, tenha naturalmente decidido abandonar o projecto da banda de Leiria e tomar um rumo a solo. O primeiro fruto desta nova aventura chamar-se-ia “Sing Me Something New” (2003) – atingiu o disco de ouro – e tinha como principais chamarizes os temas ‘Someone that Cannot Love’ e, o tema de campanha da Vodafone, ‘The 80’s’.


Foi após ter participado no projecto dos Humanos, em 2004, que em 2005 lançou “Our Hearts Will Beat as One”, composto por doze temas, um dois quais em português. A nova banda de David Fonseca era agora composta por Sérgio Nascimento na bateria, pelo guitarrista Ricardo Fel e pela pianista ex-Atomic Bees Rita Pereira (viria a tornar-se Rita Redshoes), entre outros. Tal como afirma o cantor, o seu segundo trabalho foi «assustadoramente pessoal». Bem o podem dizer as canções ‘Who Are U?’ e ‘Hold Still’, esta última em dueto com Rita Redshoes. Inicialmente era uma música sobre o que seria a solidão nas grandes cidades, acabando por se tornar simplesmente numa canção sobre a solidão.


Voltando ao início, a quote é retirada do webisódio 6 e o disco que David não o ouve como se fosse seu, é aquele que já foi apresentado por todo o país e sábado, 12 de Abril, arrebatou Lisboa num concerto que se pode chamar, no mínimo, de memorável. “Dreams in Colour” é dos três discos do cantor o mais colorido, «positivo» e «luminoso». Daí que em Setembro, no final do Verão, tenha posto todas as rádios a assobiar o primeiro singleSuperstars II’ - dois meses antes já a comunidade de fãs sabia da existência do vídeo e cantarolava em privado. O disco conta ainda com temas tão diversos e importantes como ‘4th Chance’ (que aproveita as trompetes de um bando de mariachis), ‘Kiss Me Oh Kiss Me’ (o tema do momento), ‘This Wind, Temptation’ (o tema mais negro do disco) e uma cover do êxito de Elton JohnRocket Man’. David Fonseca afirma que a música não é um tema fácil e chamou-lhe a atenção por apontar «uma segunda vida, um segundo plano» no verso «I’m not the man you think I am at home». Para além do polémico vídeo do travesti (que afinal até foi bem aceite), David consegue manter-se em todas as linhas da frente, quer com temas de sucesso em rádios comerciais, quer com os outros em rádios alternativas.


A diferença deste último disco para os anteriores está na nova musicalidade e nas facetas de inovação estética que o caracterizam. De música para música, novos ritmos, novos sons e novas tendências. ‘Silent Void’ e ‘This Raging Light’ põem de lado as baladas de guitarra acústica na mão predominantes nos discos anteriores, conseguindo pôr a dançar e surpreender quem pensava não estar perante o maior artista português contemporâneo.


(fim da parte II)


Entrevistas: South By Southwest, Sobre P.T. Anderson;


Coliseu: Preparação, Ao Vivo (Silent Void + Kiss Me, Oh Kiss Me);


Pedro Xavier


David Fonseca live @ Coliseu (parte I de III)

“De todos os mistérios que diariamente me são colocados, o mais constante e persistente é só um: o que vou fazer a 12 de Abril de 2008? Podia jogar à bola, andar de baloiço, conduzir, blogar, dormir; podia comer uma banana ou um gelado ou uma bolacha; podia empilhar lenha ou olhar para o céu vazio, mas não. De todos os dias do ano, este é um dia especial. Uma das salas mais bonitas do nosso país, as histórias e as canções da minha viagem pessoal, uma explosão dos meus sonhos a cores e ao vivo. Como se fosse a primeira vez. Tudo, todos, ao mesmo tempo e de uma vez só, como nunca antes visto. É isso que vou fazer no Coliseu de Lisboa, dia 12 de Abril de 2008. E tu?” – David Fonseca


Foi com esta premissa retirada do webisódio (*) extra que David Fonseca deu a conhecer ao seu público a intenção de realizar, finalmente, no Coliseu de Lisboa, o seu primeiro concerto a solo (já lá tinha estado antes com os Silence 4 e com os Humanos). Não seria a primeira vez que David tinha este género de iniciativa. Decorria Julho de 2007 e David lançava pela web o primeiro de uma série de webisódios auto-biográficos (e realizados pelo mesmo) que, para além de dar a conhecer mais um pouco de si, tinham como intuito final tornarem-se num meio promocional gratuito (as visitas ao blogue e os comentários chegaram aos milhares).


Já aqui se notava a iniciativa de um cantor Português (o único?) em se adaptar e lutar contra, através de um meio gratuito e em conformidade com a rápida evolução das coisas que caracterizam este novo século, as circunstâncias auto-destrutivas de uma indústria em queda livre. Como consequência, foi com naturalidade que no mesmo mês do webisódio 1 surgiu, em primeira mão, o vídeo de “Superstars II”, o single do terceiro disco do cantor: “Dreams in Colour” foi lançado 10 anos após a estreia em “Silence Becomes It”, o primeiro de originais dos “Silence 4”.


Foi a seguir esta política promocional que David ia conseguindo cativar (ainda mais) os fãs e aumentar as expectativas em torno de “Dreams in Colour”. De vídeo para vídeo, iam surgindo elementos novos, novas formas de pensar e de fazer música, até que finalmente foram começando a aparecer os primeiros acordes das novas canções. Tal como no blogue, o cantor prometeu muitas novidades para o concerto, de lotação esgotada, no Coliseu. Desde elementos cénicos a novos temas [Orange Tree], o espectáculo prometia ser inovador e totalmente diferente do que até agora tinha sido a concepção de concerto em Portugal (já lá iremos). David Fonseca adiantou ser um «espectáculo no seu todo» e não «um desfilar de canções» como muitos artistas fazem.


(fim da parte I)


* Definição de Nuno Markl para um episódio que é unicamente editado na Web.


Webisódios: 1 e 2, 3, 4 e 5, 6


Vídeos: Superstars, Rocketman, Dreams in Colour


Pedro Xavier


sexta-feira, 11 de abril de 2008

A Casa Quieta

O nome de Rodrigo Guedes de Carvalho é bem conhecido de todos nós certamente como o de um pivô e não como o de um romancista. O apresentador de informação da estação televisiva SIC, recentemente convertido a ficcionista, tem já vários romances editados. A estreia foi dada com “Daqui a Nada” (1992) vencedor de um prémio de Jovens Talentos, o primeiro de quatro romances que lhe seguiriam. Surgiram, já no século XXI, “A Casa Quieta” (2005), “Mulher em Branco” (2006) e “Canário” (2007). Foi também em 2005 que ficou associado ao filme de terror “Coisa Ruim” por ter assinado o argumento do filme co-realizado pelo irmão Tiago Guedes.


Aqui em análise está a casa que quieta é agitada pelo turbilhão de sentimentos do casal Salvador e Mariana, lisboetas de classe média alta, não querendo filhos aproveitam para viajar frequentemente e, por vezes, visitar família instalada no Canadá. A casa está vazia. A maior parte do romance decorre em Lisboa, onde a cidade iluminada pelo Tejo se torna totalmente cinzenta para apimentar mais um imaginativo e depressivo drama suburbano.


A obra é organizada por construções e desconstruções de capítulos, analepses e prolepses que, parecendo inicialmente confusas, trazem uma estranha sensação estarmos perante um objecto sedutor (e é!), intrigante e coeso no seu enredo que premeia o leitor, tornando-o cúmplice pela simplicidade do entrecruzar inteligente de histórias. O modo de cuidar das palavras e estruturar a sua prosa está muito longe de desapontar, mas não é de todo a mais original. Sente-se, portanto, a influência de vários autores, mais particularmente a do ex-médico escritor António Lobo Antunes, que Rodrigo Guedes de Carvalho reconhece como um dos melhores e uma influência literária permanente. E isso nota-se ao serem revisitados os temas da Guerra Colonial (a loucura pós-guerra do irmão), o relacionamento rígido com o pai, os desencontros de amor, a solidão individual, a morte, as idas às putas, etc.


No entanto, a ideia de ser uma colagem de uma maneira de escrever é totalmente desmentida a partir do momento em que a cada personagem é atribuído um estilo distinto – por vezes, capítulos seguidos tornam-se desafiantes à capacidade de concentração do leitor para acompanhar quem é quem.


O segundo romance de Rodrigo Guedes de Carvalho é assombroso na sua eloquência, inovador na estética e repleto de verdadeiras emoções cáusticas, reveladoras da maneira de sentir de cada um de nós.


"Pudéssemos viajar, não para lugares longínquos de paisagens tremendas, não ao encontro de outros povos, culturas e cheiros, outras gentes e sabores, mas ao interior uns dos outros." - Rodrigo Guedes de Carvalho

Pedro Xavier